Há boates que funcionam sem alvará
Após adquirir licença para funcionar como bar ou restaurante, casas mudam de serviço. Fiscalização deverá apertar o cerco.
Os secretários de várias pastas municipais e órgãos ligados à segurança e licenciamento das casas de espetáculos da capital se reuniram na manhã de ontem para definir estratégias para garantir que os estabelecimentos com aglomeração de pessoas em Goiânia estejam preparados para ocorrências como a que aconteceu em Santa Maria, evitando que ocorra por aqui uma tragédia como a que aconteceu no Rio Grande do Sul.
Um dos grandes problemas levantados durante o encontro é o fato de que muitos bares e restaurantes têm o alvará de funcionamento, mas acabam funcionando como boates, sem o alvará específico para esses casos.
Secretário de Fiscalização da Prefeitura de Goiânia, Allen Viana explica que por isso é difícil especificar o número de boates da capital. “Muitos iniciam como bares e acabam funcionando clandestinamente. Vamos intensificar a fiscalização para adequar os que estão nessa situação”, observa. Segundo ele, pelo menos as 40 principais boates e casas de shows de Goiânia devem receber os fiscais ainda antes do carnaval.
Presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes em Goiás, Rafael Campos Carvalho admite que existem estabelecimentos funcionando sem o alvará adequado e sugeriu que seja feito um mutirão de regularização em 90 dias da fiscalização, já que, segundo ele, a burocracia muitas vezes atrapalha os estabelecimentos que querem se regularizar. Ele lembra que a maioria dos proprietários de bares e boates precisa de orientação sobre as adequações que precisam fazer em seus estabelecimentos. “Vamos educar primeiro. Dono de bar não foi formado em Havard, foi formado na cozinha,” declara.
De acordo com a Polícia Federal – responsável por fiscalizar os vigilantes que trabalham em boates e casas de show, bem como as escolas que formam esses profissionais –, a maioria dos seguranças que atuam em boates não possui o curso de formação exigido. “Eles devem ter treinamento para evacuação, primeiros socorros e combate a incêndio,” explica a delegada Esmeralda Aparecida de Oliveira e Silva. Segundo ela, a maioria dos contratados são autônomos, sem vínculo com nenhuma empresa especializada ou com o estabelecimento onde trabalham. “Maioria atua de forma clandestina. E a lei não cobra nada da empresa que contrata,” lamenta. Ela destaca que a PF intensificará a fiscalização e exigirá que esses profissionais tenham carteira expedida pelo órgão.
Pirotecnia é proibida em ambientes fechados
De acordo com o Código de Postura de Goiânia, apresentações pirotécnicas em ambientes fechados, como a que causou o incêndio em Santa Maria, são proibidas. No entanto, isso não garante que elas não aconteçam, segundo o superintendente do Procon Municipal, Miguel Tiago. Ele lembra que muitos itens presentes no código simplesmente não são obedecidos. “Muita tragédia poderia ser evitada se as pessoas simplesmente cumprissem a lei. Espero que esse fato em Santa Maria chacoalhe toda a sociedade, para que haja uma mudança de atitude,” destaca.
Segundo o Corpo de Bombeiros, uma lei estadual também dita regras rígidas sobre os shows pirotécnicos. “É só seguir a lei,” apela o comandante de Operações da Defesa Civil, tenente-coronel Lopes, representante do Corpo de Bombeiros na ocasião. Ele volta a afirmar, no entanto, que Goiânia não tem grandes problemas quando comparada a outros lugares porque a corporação atua de forma rígida na cidade. “Precisamos ter sobriedade e calma em relação a Santa Maria. Temos problemas, mas não tantos assim,” diz.
Um dos pontos que também merece atenção, segundo Lopes, é o fato de muitas boates funcionarem superlotadas. “Às vezes estão dentro das regras, mas para uma quantidade de pessoas, aí excedem essa quantidade. Muitas vezes a própria população não se conscientiza do risco que está correndo ao entrar num lugar assim,” comenta. Ele lembra ainda que em muitos eventos a decoração bloqueia as saídas de emergência e pede a atenção de todos para que isso não aconteça.
“É tarde para Santa Maria, mas não para nós”
Depois de muita discussão e divergência de opiniões foi definido que uma força-tarefa vai intensificar a fiscalização nos estabelecimentos, iniciar um trabalho de conscientização e estudar mudanças na legislação e a criação de um comitê de emergência. Secretária de Defesa Social, Adriana Accorsi sugeriu ainda que seja confeccionado um material informativo em conjunto entre os órgãos, a ser distribuído para toda a sociedade. A ideia deve ser colocada em prática nos próximos dias, de acordo com o que decidiram os membros da mesa.
Adriana Accorsi destaca que a fiscalização é importante, mas que, antes de fiscalizar, é importante desenvolver um trabalho de conscientização. “Nem todos sabem manusear um extintor de incêndio, como aconteceu em Santa Maria. É preciso ter alguém treinado para isso nessas casas. Também é importante que as pessoas saibam como agir, senão de nada adianta o local estar adequado. Espero que esses jovens mortos não sejam esquecidos, que essa tristeza toda sirva para que ocorra uma transformação. É tarde para Santa Maria, mas não para nós,” pontua.
Fonte: Jornal O Hoje