Em Goiás, servidor ganha mais do que Marconi

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O vencimento acima do teto constitucional está em todos os poderes

O Tesouro Estadual pagou à auditora fiscal da Receita de Goiás Ângela Maria Barbosa Toledo Costa, em outubro de 2012, o salário de R$ 25.478,76. O coronel da Polícia Militar Adailton Florentino do Nascimento recebeu do erário estadual, em novembro passado, R$ 23.873,58. Considerando a legislação, nenhum salário do Executivo pode exceder ao valor pago ao dirigente do Poder. Neste caso, o governador, cujo salário é R$ 20,3 mil.

No âmbito do Judiciário, o teto constitucional é maior. Até 31 de dezembro de 2012, o cofre federal pagava aos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e ao procurador Geral da República R$ 26.723,13. Em Goiás, o procurador José Eduardo Veiga Braga, membro do Ministério Público Estadual, recebeu em seu contracheque de novembro de 2012 R$ 43.228,36. À mesma época, o holerite de outro integrante do MP, o promotor de Justiça de 2ª entrância Deusivone Campelo Soares, lotado na 1ª Promotoria de Justiça de São Luis de Montes Belos (Região do Mato Grosso Goiano), revelou um provento de R$ 31.247,58.

No Palácio da Justiça, os 343 magistrados (36 desembargadores e 307 juízes) goianos recebem a título de salário-base entre R$ 19.643,97 e R$ 26.770,55. Um universo que será inflado a partir deste ano, ao terem acrescidos em seus subsídios os auxílios moradia e livro, sancionados pelo Palácio Pedro Ludovico, no primeiro decênio de dezembro passado. Saliente-se que um professor de carreira no estado, com formação em doutorado e após 25 anos de carreira, recebe cerca de R$ 3,8 mil mensais e nenhum auxílio acadêmico, literário e habitacional.

O auxílio-moradia é uma ajuda de custo no valor de 10% do salário do juiz (ler tabela). Já o auxílio-livro é um incentivo para compra de livros jurídicos - impressos ou eletrônicos - limitado a 12% do salário de juiz substituto (ler tabela). Juízes auxiliares da Presidência, da Corregedoria Geral de Justiça, de Ouvidor de Justiça e de Direção do Foro de Comarca, além de membros de Turmas Recursais, também passam a ganhar o direito de 10% a mais no salário. A nova lei determina que o desembargador terá direito a 20% do salário quando for presidente ou corregedor geral do Tribunal de Justiça.

Esse cenário é caracterizado pelo presidente do Instituto Goiano de Direito Constitucional (IGDC), o conselheiro OAB Otávio Fortes, como excepcionalidades. “Temos que considerar algumas particularidades. Aqueles que já recebiam vantagens pessoais até a Emenda 41 (entrou em vigor em 1º de janeiro de 2006) não as pode ter limitadas pelo teto constitucional então criado. São particularidades que devem ser analisadas. Tem os casos de recebimento de verbas indenizatórias, como o caso do ressarcimento de um promotor, ao responder em substituição por uma comarca. Há por outro lado, os cargos antigos, como os de auditores da Receita Estadual que tem vantagens adquiridas”.

Essa vasta gama de excentrismo legal, entretanto, não invalida o fato de que o cidadão tem o direito saber quanto ganha um servidor público. Em Goiás, porém, o Judiciário tem respaldado algumas categorias do funcionalismo público a esconderem os valores dos seus salários dos olhos do contribuinte. É o caso da Assembléia Legislativa de Goiás (Alego), e do Tribunal de Contas do Estado (TCM). Os sindicatos dos servidores destas duas Casas conseguiram que o titular da 3ª Vara de Fazenda Pública Estadual, juiz Ari Ferreira de Queiroz, concedesse liminar favorável proibindo a divulgação dos seus salários de modo individualizado. O constitucionalista Otávio Fortes aposta que a decisão será cassada.

“O Supremo (Supremo Tribunal de Justiça – STF) tem posição definida quanto a essa matéria de que deve sim ser dado acesso a remuneração dos servidores, inclusive para se fiscalizar se essas remunerações estão de acordo com essas decisões. Possivelmente, estas decisões contrárias serão reformadas e, assim, os dados serão acessados pelo principal fiscalizador, que é o contribuinte”.

Para Ari Queiroz, por enquanto, a publicação representaria risco aos servidores, expondo-os a situação de perigo e atentando contra o direito fundamental à vida privada e ao princípio da proporcionalidade. Apesar de a Lei de Acesso à Informação regulamentar a forma como as pessoas podem conhecer atos dos poder público que sejam de seu interesse, Ari Queiroz acredita que, juridicamente, a matéria é inconstitucional tanto do ponto de vista formal quanto material. Isso porque a Lei 12.527, de 18 de novembro de 2011, não pode ser aplicada de modo automático nos Estados, uma vez que, de acordo com a Constituição, cabe à União editar norma de caráter geral e, aos Estados, suplementá-las para adaptar as suas peculiaridades. O magistrado garante que está convencido de que a veiculação de valores serve apenas para atender a curiosidade pública.

“Eu digo que interesse público tem que ser sempre preservado em qualquer circunstância. Mas interesse público não se confunde com curiosidade pública. Não há bom senso e nem lógica em querer que a população saiba quantos centavos integra a folha de pagamento do servidor. Eu até admito que o interesse público poderia alcançar os agentes políticos, como parlamentares, magistrados, governantes. Mas o servidor em geral não passa de uma curiosidade”.

Sancionada há 13 meses pela presidente Dilma Rousseff e em vigor há oito meses, a Lei de Acesso à Informação não pegou fora do Executivo federal. O texto ainda é um desconhecido dos brasileiros. Apesar de Goiás ter cerca de seis milhões de habitantes, ao longo de todo o ano de 2012 a Ouvidoria Geral do Estado contabilizou parcas 381 requisições com base na Lei de Acesso à Informação, que entrou em vigor em 16 de maio do ano passado. Os dados constam do relatório da Controladoria Geral do Estado (CGE). De acordo com a CGE, o tempo médio para atendimento foi de 15 dias. A lei estabelece até 20 dias. O relatório aponta ainda que 368 pedidos foram finalizados e 15 estão em andamento, dentro do prazo estipulado para o fornecimento de resposta. Os órgãos que mais receberam pedidos foram Secretaria da Saúde, Detran, Segplan, CGE, Agetop e Educação.

Assembleia desconhece Lei da Transparência

Enquanto os 14º e 15º não voltam a figurar no holerite, os deputados estaduais estão recebendo, mensalmente, R$ 20.042,00. A título de ajuda, mensal e sem qualquer abatimento, há o auxílio moradia, no valor de R$ 2.250,00. Isto não quer dizer que o parlamentar goiano custeie combustível, material gráfico, passagens aéreas, locação de veículos e funcionários. Para quitar estas despesas, a Assembleia Legislativa disponibiliza R$ 66 mil para cada um dos 41 deputados, sendo R$ 45 mil a verba de gabinete e R$ 21 mil a verba indenizatória.

Estas informações, contudo, não estão disponibilizadas no Portal da Casa. O conceito transparência sobre as contas do Poder Legislativo em Goiás é controverso. No site não se é possível acompanhar qual o salário e os benefícios recebidos pelos deputados. As despesas com pessoal, por exemplo, estão na página oficial do Parlamento, mas de modo genérico, incompleto e referente apenas ao ano de 2011, apesar do orçamento de 2012 ter destinado 56,81% (206.856.000,00) dos seus recursos para gastos com pessoal.

Há informações de servidores que ganham mais do que deputados. O assunto é tão sensível dentro do Parlamento que a simples menção sobre o assunto faz a maioria dos servidores se eximir até mesmo em retornar ligações. Todos que foram procurados pela Rádio 730 para falar do assunto, optaram por indicar a Diretoria Geral como a mais aptas a responder as questões. O titular do cargo, Milton Rodrigues Campos, porém preferiu o atalho do ‘estou impedido judicialmente’. Questionado sobre a extensão do anteparo preferiu o ataque, garantindo que não aprovaria nenhum critério alegado, caso a reportagem insistissem em requerer os dados por escrito.

— Fazer matéria é um critério fraco e já adianto que não vou deferir o pedido.

— A lei me garante o acesso, pois a liminar está circunscrita apenas a publicidade na internet.

— A senhora é advogada? Eu sou e na minha análise eu decido ou não se vou lhe entregar os dados. E eu decido não entregar.

Em 2009 e 2010, a o Parlamento Goiano, apesar do orçamento de R$ 1,5 bilhão, ultrapassou o limite de gastos com pessoal imposto pela Lei de Responsabilidade Fiscal. Aliás, o excesso de gastos em 2010 resultou no impedimento da liberação de empréstimo a Goiás, que teve que recorrer à Justiça, argumentando que eram poderes distintos e com dotação orçamentária diferentes. O protagonista deste cenário é o mesmo deputado que voltará a comandar, pela terceira vez, o Parlamento, Helder Valim.

Fonte: Portal 730