“O VLT é prova de que o governo pensa no coletivo e não no individual”

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Secretário responsável pela região metropolitana de Goiânia diz que o VLT vai revigorar o Eixo Anhanguera e considera o lixo como principal problema da capital e dos municípios vizinhos
Fernando Leite/Jornal Opção
A entrada de Silvio Sousa para o mundo da política foi há pouco tempo e por amizade. Mas não no sentido convencional: ele foi convidado por um colega de atividade econômica: empresário da área de seguros, ele recebeu em 2010 o convite do hoje deputado Armando Vergílio (PSD) para coordenar sua campanha rumo ao Congresso. Eleito, o amigo se tornou secretário estadual das Cidades, cargo que deixou para seguir para a Câmara dos Deputados e depois seria assumido, interinamente, por Silvio, que então já era secretário estadual de Desenvolvimento da Região Metropolitana.

Em sua primeira entrevista ao Jornal Opção, Silvio Sousa se define como um “pacificador”. E vem demonstrando isso em suas ações à frente da pasta. É um dos principais responsáveis pela condução do processo relativo à obra do Veículo Leve sobre Trilhos (VLT) que será implantado no Eixo Anhanguera. “É algo que não queremos politizar e a prova disso é que a inauguração se dará em um outro mandato de governo”. Ele prevê uma nova vida para a Avenida Anhanguera a partir do advento do VLT. “Todas as cidades que adotaram esse modal tiveram a recuperação de seus centros históricos.”

À frente de outras questões da região metropolitana, ele se preocupa de modo especial com o lixo produzido em Goiânia e nos municípios vizinhos. “Precisamos juntar esforços para resolver esse que é principal drama que atravessamos no momento”, declara. Goianiense, Silvio é formado em Administração com especialização em Comércio Exterior e em Negócios Internacionais.
Euler de França Belém — O sr. garante que o VLT é realmente uma solução para a Grande Goiânia?
Sobre o VLT, hoje eu sou uma pessoa extremamente convencida de sua necessidade. Escolhemos Goiânia para viver, é nossa cidade. Precisamos deixar de lado certo provincianismo negativo — porque existe um provincianismo positivo também.

Eu nasci em Goiânia, sou goiano do pé rachado, andei de Eixo Anhanguera muitos anos de minha vida. As escolhas de algumas lideranças é que mudam o perfil de uma cidade. Hoje temos uma liderança incontestável, que é o governador Marconi Perillo, que, no passado, fez algumas escolhas que mudaram o perfil de nosso Estado, não há como ir contra isso. Estive agora em Boston (EUA), onde meu filho estuda, e, conversando com algumas autoridades, vi que as pessoas conhecem o governador de Goiás. Meu filho, em Cam­bridge, acessa o Jornal Opção. Isso se deve, em grande parte, a uma nova mentalidade, seja de um governo estabelecido ou de pessoas que estão aliadas a essa ideia. Os governos de Marconi deram uma nova roupagem ao Estado. Da mesma forma, não posso dizer que a gestão Iris Rezende na Prefeitura de Go­iânia não tenha dado uma nova imagem para a cidade. Cada gestor tem suas qualidades e defeitos. O que vejo como provincianismo negativo é a politização de todas as questões. Isso não é preciso. Fizemos, lá atrás, um acordo de não politizar a questão do VLT. Já disse em vários veículos que o prefeito Paulo Garcia (PT) foi extremamente honrado conosco. Até o mo­mento em que a Prefeitura de Goiânia assinou a deliberação 72 — que prorroga a concessão de 20 para 35 anos e delega ao Estado o poder concessório para licitar. Tanto é que passamos por uma eleição e o VLT não foi pauta negativa, nem por um lado nem por outro. Com o VLT e o BRT, o sistema de transporte coletivo na capital nunca esteve com um ambiente institucional tão bom, para que agora avance de fato. Temos o BRT Norte-Sul, que é uma obra importante dentro do sistema, o VLT Leste-Oeste e vários corredores preferenciais. Ou nós abandonamos de vez a lógica “100% carro” e começamos definitivamente a investir em transporte coletivo de qualidade ou vamos sempre ter a impressão de que transporte público é coisa de pobre. Esse é também um provincianismo negativo, o de não usar ônibus por ser “coisa de pobre”. Aí a pessoa vai para a Europa, Londres, qualquer lugar, e acha que está bonita na fotografia. Mas não é, o que ocorre é que lá existe transporte público de qualidade e todas as pessoas têm essa consciência de uso dele. E há uma tendência mundial para se investir mais em transporte de massa e reduzir o uso de carro. Isso é em Londres, Paris, Boston ou Nova York. E cada vez há maior atenção à integração dos sistemas. Em Paris, até bicicleta se integra ao transporte coletivo.
Elder Dias — No imaginário, o famoso “Eixão” ou “Transurbão” tem já uma simbologia. Inde­pendentemente de alteração na velocidade de deslocamento, a simples mudança simbólica de ônibus para VLT já pode trazer consigo uma mudança também de cultura?
Não tenho dúvidas. Para­digmas existem da seguinte forma: você quebra um e cria outro, à medida que se instala um processo — e o VLT não é um processo em si só, mas integrado aos outros modais em Goiânia. Durante nossa existência vamos utilizar vários modais, vai haver o convívio entre ônibus, táxis, mototáxis, VLT, BRT e, possivelmente, metrô. Hoje há 2,25 milhões de habitantes na região metropolitana de Goiânia. Daqui a dez anos a projeção é de mais de 3,2 milhões. Logo estaremos com 5 milhões na mesma área. Aí, sim, começaremos a ter demandas que pedem um me­trô, modal completamente segregado, que seria o nível ideal. Mas, respondendo sua pergunta, a simples mudança, só ela em si, provoca apenas certa curiosidade. O que vai provocar mudança de cultura realmente é a entrega de um serviço de qualidade o qual as pessoas comecem a usar e nele confiar. A partir do momento em que um serviço tem regularidade, confiabilidade, segurança, conforto e conveniência, as pessoas vão pensar melhor. Um exemplo disso: a pessoa vem de Trindade e acha, na região do Terminal Padre Pelágio uma área de estacionamento onde poderá deixar seu veículo, com tudo monitorado e pegar o VLT para vir ao Centro da capital resolver a vida dele. Pra que, então, essa pessoa vai entrar de carro em Goiânia? É um conceito que é uma tendência global, não estamos inventando a roda, não. Quando o governador Marconi Perillo fez o decreto autorizando um grupo privado a desenvolver um estudo para implantação do veículo leve sobre trilhos, foram trazidas para dentro desse processo as maiores autoridades mundiais, em termos de notório saber, para dentro desse projeto. Hoje estão envolvidas nesse projeto empresas de ponta da Europa e também do Brasil. O portfólio de conhecimento inserido nesse processo mostra que não estamos inventando nada, mas pegando as melhores experiências e traduzindo em um projeto para Goiânia. Isso, sim, muda a cultura, a partir de algo que já é funcional, largamente utilizado e que está se transformando em uma ferramenta de gestão urbana. Em Reims, na França, temos um processo muito parecido com o de nossa capital. Há lá um trajeto um pouco maior, mas que corta a cidade ao meio. Lá também os comerciantes também tinha o temor de perder os clientes motorizados, a princípio. Com o tempo, porém, ocorreu o contrário, viram que o cliente pedestre, para o comércio de rua, é muito mais eficaz do que o motorizado. Dando um exemplo nosso, se alguém vai a Campinas para uma loja “x”, vai dirigir até achar uma vaga. Se, de repente, encontrar onde estacionar perto de uma loja “y” que seja uma opção de compra em relação à primeira loja, com certeza vai voltar nesta. Entretanto, a partir do momento em que o pedestre tem sua vida facilitada, com calçadas e passeios apropriados, é possível ter compras indutivas além das específicas. O comércio começa a ganhar qualidade. Quantas vezes vamos ao Centro para comprar uma carga de caneta e, podendo visualizar outras possibilidades, nos lembramos de que precisamos de outra coisa que encontramos por ali. O pedestrianismo hoje, em cidades como Londres, é altamente utilizado como ferramenta de negócio. Tanto que o próprio estilo das lojas é estudado para ser voltado ao pedestre. É uma outra cultura.

Cezar Santos — Os comerciantes reclamam muito?
O impacto do VLT no comércio é uma das questões que mais preocupam na hora da mudança. Primeiro, como eu já disse, os comerciantes se preocupam com o risco de perder os clientes motorizados. Depois, percebem que o ambiente mais tranquilo pode ser também mais rentável, porque isso desestressa o ambiente, a partir do momento em que há calçadas e passeios públicos bem cuidados e liberados ao pedestre. As respostas das experiências na França, na Ale­manha e nos Estados Unidos — passada a fase de obras, que pode ser realmente um pouco estressante — mostram que o comércio retoma globalmente suas atividades e geralmente melhoram exponencialmente sua lucratividade. Isso vale especialmente para lojas dos centros das cidades: todos os centros históricos que visitamos voltaram a ter comércio de qualidade e mais rentabilidade depois do VLT. É difícil isolar os efeitos do VLT em relação ao comércio, mas todas as experiências se mostraram extremamente positivas. Por fim, gestores têm de tomar decisões, e estas vão impactar no coletivo. Quando um grupo é impactado de forma particular, esse grupo vai para cima, faz seu lobby. Só que nossa função não é pensar no individual, mas no coletivo. O governador determinou que ouçamos todos, mas que pensemos na cidade como um todo. Não dá para pensar só em um grupo e em seu problema. Vamos ouvir, acumular experiências com as sugestões que eles nos apresentarem, mas a decisão tem de se basear no conjunto. É preciso dizer também que estamos projetando o ambiente de hoje para 2045, ou seja, estamos operando no limite e fazendo a transferência para um tipo de modal que vai ampliar essa capacidade para mais 35 anos.
Cezar Santos — E como tem sido a receptividade em relação a isso?
Às vezes as pessoas me perguntam por que o VLT e não mais ônibus. Tem gente que diz que bastam mais veículos nas ruas e não precisaria mexer em nada. Ora, para não mexer em nada nem precisaria colocar mais ônibus, porque já trabalhamos na capacidade limite. Se colocar mais ônibus só vamos criar mais tumulto na via, porque não há pontos de ultrapassagem no Eixo Anhanguera. A partir do momento em que um ônibus para no cruzamento — temos 54 ao longo do eixo — o que vier atrás vai parar. Se eu colocar mais um terceiro ou um quarto, como sugerem essas pessoas, o que vou criar é simplesmente um comboio.
Euler de França Belém — Mas o VLT não vai parar nos semáforos?
Boa pergunta. O projeto do VLT tem um caráter um pouco diferente do atual projeto. Em relação aos cruzamentos, vamos reduzir de 54 para 32, que ainda assim é superior aos 28 do início do Eixo Anhan­guera. Ao longo do tempo, a pressão dos comerciantes fez abrir a via e aumentaram os acessos. Por que isso aconteceu? Porque aumentou naturalmente a quantidade de carros. Hoje temos 1,09 milhão de veículos em Goiânia e a projeção até dezembro é de 1,16 milhão. Isso dá praticamente um carro por habitante. Então, há naturalmente uma pressão por abrir cruzamentos e ruas. Isso não resolve o problema do tráfego, pelo contrário, cria outros problemas. O VLT terá como característica o menor número de cruzamento das vias e o controle eletrônico da semaforização — a partir do mo­mento em que o trem se aproximar o semáforo vai lhe dar a prerrogativa da passagem. Afinal, há um veículo carregando 600 pessoas, um transporte de mas­sa que precisa ser priorizado.
Frederico Vitor — Como será a capacitação dos operadores do VLT?
Hoje, 30% dos processos de VLT existentes são com condução eletrônica, sem condutor à vista. Na licitação para o Eixo Anhanguera, o governador exigiu que houvesse condução à vista, com monitoramento, porque temos a necessidade de assimilar pessoas. E com um detalhe: também não temos uma cultura do uso do trem. A experiência do ferrotransporte em Goiás foi com trens antigos, há muito tempo, e nada urbano. Agora, não: o VLT é uma experiência urbana de ferrotransporte, que vai ser operado com condução à vista. É bom observar que quem vai fazer a operação não será o Estado, que fará a licitação de concessão da operação e da obra global. Ou seja, estamos licitando a implantação e a operação. O operador deverá seguir algumas qualificações técnicas que o edital está determinando. Uma delas é corpo técnico altamente qualificado, treinado nas melhores oficinas do mundo.  Por exemplo, temos hoje o VLT de Paris que é condução à vista, em situações semelhantes à de Goiânia, cortando o centro urbano ao meio. Então Paris pode ser uma das perspectivas de treinamento de material humano, seja para ir até lá ou para virem aqui ministrá-lo.
Euler de França Belém — Os funcionários da Metrobus serão demitidos?
A Metrobus é uma companhia de transporte como outra qualquer, a diferença é que como um de seus sócios o governo. Mas é uma companhia como a Rápido Araguaia ou qualquer outra, só que operando um eixo específico.  Temos três opções em que estamos trabalhando: a extensão do Eixo Anhanguera até Trindade, até Goianira ou até Senador Canedo. Como você mes­mo disse, não adianta hoje pensar na secretaria apenas com o VLT. Não é mesmo, temos um problema metropolitana.

Temos regiões adensadas, todos os dias chegam a Goiânia 800 mil pessoas. Elas entram e saem da capital. Só no Eixo Anhanguera são 240 mil pessoas. Este é o principal tronco alimentado, mas os alimentadores carregam e descarregam todo dia 800 mil pessoas. De onde vêm essas pessoas? Se pegarmos daqui até Goianira, você verá no mínimo 20 novos loteamentos que estão sendo povoados. Então, quem vai se responsabilizar por essa demanda, como ela vai ficar? A Metrobus tem capacidade, inclusive, de participar da licitação do Eixo Norte-Sul — a Prefeitura também não vai operar nada, vai apenas fazer a obra de infraestrutura e fazer a licitação da operação do Eixo.
Elder Dias — E a Metrobus pretende participar?
Pode ser um viés. A Me­trobus tem uma frota de ônibus muito nova, tem capacidade de gestão, tem motoristas qualificados para eixo segregado, que é uma expertise que, às vezes, outras empresas não têm. En­tão, pode ser que sim, é uma das possibilidades.
Euler de França Belém — Um estudo diz que há pontos de alagamento ao longo da Ave­nida Anhanguera, como na área do Lago das Rosas. Os ônibus podem desviar, mas como se fará com o VLT?
Elder Dias — A Prefeitura fez algumas observações sobre isso na reunião no fim de ano, no Paço.
Euler de França Belém — Outra questão é que não haveria problemas para o VLT subir em algumas regiões, como nas proximidades do Córrego Botafogo, e que teria de se fazer um aterro ou algo assim?
O VLT é uma tecnologia moderna que muita gente confunde com o metrô. Mas não é: ele é um veículo muito mais leve e ter motores elétricos em rodas individuais, ou seja, cada conjunto de rodas tem um motor elétrico gerando força motriz para sua propulsão. A inclinação que ele suporta é de até 7%. O único local em que temos isso na via é nas imediações do Setor Palmito, onde ele vai ser “enterrado” antes da BR-153 e vai sair em um elevado depois, para reduzir a declividade e a aclividade. É o único local que causa impacto na força motriz do VLT para o conjunto, que é formado por dois carros de seis vagões, ou seja, teremos um comboio de 12 vagões.
Euler de França Belém — E em relação aos pontos de alagamento?
Isso já foi objeto de estudos. A altura do VLT em relação à dos ônibus é muito diferente. Outro ponto é que a própria instalação dos trilhos se faz sobre grama, então o canteiro central, por si, já é permeável. O trajeto só terá piso impermeável nos cruzamentos e na parte do Centro, entre as avenidas To­cantins e Araguaia, onde não haverá tráfego de veículos — à exceção dos de serviço. Haverá um amplo calçadão ao largo do VLT. Será uma área totalmente pedestrializada, à exemplo do que ocorre em Paris, na Bastilha, ou no centro de Londres. O projeto será em conjunto com a Prefeitura, que já está com um projeto para propor, na Câmara de Goiânia, que haja naquela parte do percurso a recuperação de um distrito histórico, do acervo de art déco etc. Se formos olhar hoje, veremos uma poluição visual extremamente degradante, lugares impensáveis onde hoje têm outdoors. A ideia é devolver o espaço à cidade como área de contemplação, de recuperação de fachadas. O próprio comércio, com os lojistas, vai perceber que será um bom negócio, que vai ter ganhos exponenciais se investir. As áreas de alagamento, então, serão extremamente mitigadas, à medida que se tenha áreas permeáveis por onde passará o trem. Tem um grupo de sondagem trabalhando agora, no período das chuvas, que percebeu que esses alagamentos são pontuais e geralmente nas extremidades da via, nas galerias pluviais. E aí eu falo que nem a própria Pre­feitura tem um inventário desse passivo que está na Anhanguera, em relação a esse aspecto. Fi­zemos um trabalho de sondagem em toda a via, metro a metro. Descobrimos que têm galerias hoje que estão obstaculizadas, interrompidas. Para resolver o problema, será preciso trocar toda a tubulação. E, nos pontos em que disse que deverá haver intervenções pontuais, a obra de engenharia do VLT fará o trabalho. O que não temos condições de resolver é um trabalho geral, que é do município. Aliás, nem temos nem autorização legal para fazer isso.
Cezar Santos — Quando começa efetivamente a obra do VLT? Quais são os prazos?
A instalação de um sistema de VLT em uma cidade gera vários impactos, seja no comércio, no trânsito ou na vizinhança. Temos uma preocupação com os comerciantes, mas também com os moradores — porque às vezes a gente acha que lá existe só comércio, mas também há moradores na Avenida Anhan­guera. Há uma preocupação geral com o período de obras e uma citação recorrente se refere a 1998, na gestão de Maguito Vilela e Naphtali Alves, se não me engano. Naquele ano foi feita uma inserção que, sem medo de ser ofensivo nem nada, posso dizer que aquilo foi um desastre, um estupro. Não havia um projeto, tudo foi feito sem nenhum estudo, simplesmente descascaram a Anhanguera de ponta a ponta, segregaram a via sob todos os aspectos. Era a máquina na frente e o engenheiro atrás, riscando, fazendo o projeto. Uma aberração, tudo sem conversar, sem trocar ideias com as pessoas. Desta vez, estamos há um ano e meio respeitando todas as questões legais e processuais, discutindo com a comunidade, apesar de algumas pessoas veicularem matérias dizendo que há desinformação. Ora, a partir do momento em que o processo está todo na internet, disponível à consulta pública, falar em desinformação é no mínimo algo leviano. Temos a preocupação de mitigar esses impactos ao máximo possível, mas não há como fazer omelete sem quebrar ovos. É uma velha máxima que realmente é verdadeira.



Se queremos mudar de um patamar para outro, existe um custo de mudança. Aqui, se vocês perceberem que o jornal cresceu e que é necessário ampliá-lo, vai existir esse custo. Por um período, até voltar ao status de operação normal, isso vai causar transtornos, mas, depois, isso vai gerar dividendos também, para todos os que trabalham no jornal, vai haver um ambiente melhor, uma série de situações positivas. Com relação ao tempo da obra, estamos no melhor momento do VLT. Passamos agora por uma reunião da Câmara Deliberativa do Transporte Coletivo (CDTC), na qual os prefeitos de Goiânia e de Aparecida e o representante dos demais prefeitos da região metropolitana, além da agência reguladora e os demais agentes do município que fazem parte da câmara, assinaram um documento dizendo ao Estado que estavam prorrogando a concessão de 20 para 35 anos e delegando o poder de licitar. Agora o arcabouço legal está sendo analisado pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE). E é preciso que haja essa situação, até porque um edital de concorrência internacional depois de lançado sofrer uma interrupção legal é algo muito ruim. Estamos, então, nos precavendo dessas questões. O período de obras é de dois anos, de seu início até a operação. Se fizermos o lançamento do edital agora em marco, como está previsto, o início das obras será em agosto. Isso é até um indicador de que não estamos politizando essa questão, porque a conclusão vai transcender o mandato atual. O governador Marconi já disse que absolutamente não tem interesse em politizar nada, que quer apenas fazer e entregar para a população um serviço de qualidade. Muita gente diz a ele, “olha, não vai dar tempo de inaugurar em seu mandato”, só que esta não é a perspectiva principal do processo. Por outro lado, há a questão da obra em si. Hoje, todo o sistema do VLT é carregado de muita tecnologia, inclusive na obra civil. O VLT de Jerusalém, o mais recente a ser instalado — cruza a cidade ao meio por 16 quilômetros, um pouco maior do que o nosso —, teve a parte de obra civil concluída em sete meses. Portanto, a obra civil não é o maior problema, o que pesa mesmo é a entrega do material rodante. Hoje temos três fabricantes mundiais em larga escala: a Alstom, na França; a Bombardier, no Canadá e com sede na Alemanha também; e a Deutsche Bahn, que é alemã de origem. Estamos com uma pré-agenda, fizemos isso no ano passado, mas precisamos cumpri-la. A obra civil tem um sistema de implantação chamado “clean build”, que significa “obra limpa”, em inglês: a frente de trabalho vence 200 metros do percurso a cada 15 dias e deixa o trilho organizado, fechando somente o canteiro central — não há o fechamento das laterais da via. Só depois que tiver implantado todo o eixo é que iremos para a parte de obra de arte, que é o que chamamos de “fachada a fachada”, que é a adequação das calçadas, entre outras coisas. É bom lembrar que não estamos tratando apenas de uma mudança de meio de transporte, mas de uma requalificação de todo o Eixo Anhanguera. Vamos citar a região do Dergo como exemplo. É um local que está totalmente degradado, com áreas de prostituição, de venda de drogas, comércio de nível qualitativo muito baixo. Em 100% das cidades em que foi implantado o VLT houve uma requalificação natural, porque uma via liberada, monitorada e com um meio de transporte ultramoderno, isso acaba se tornando um indutor de novos negócios. Já há notícias de empresários que estão comprando áreas próximas à Anhanguera para outra modalidade de comércio. Um exemplo é um shopping que foi lançado no Setor Aeroviário. Temos a informação de que o grupo Pão de Açúcar também comprou uma área. Isso vai naturalmente requalificando a via, resgatando um eixo que é histórico para a cidade. Então, claro que haverá um impacto, mas de forma planejada, mitigada, calculada. Não haverá nada como ocorreu em 1998, tenho clareza e tranquilidade para afirmar isso.
Cezar Santos — Qual será o custo?
Todo o projeto está orçado em R$ 1,3 bilhão, tudo já com recursos assegurados. Desse montante, uma pequena parte vem do PAC da Mobilidade, R$ 215 milhões. A Prefeitura achou por bem repassar para o VLT metade dos R$ 430 milhões que recebeu e ficar com a outra metade para o BRT Norte-Sul. Acho que foi uma boa escolha, até porque a Prefeitura está com os estudos para a obra também bastante avançados. Eu gostaria, inclusive, que as duas obras fossem licitadas no mesmo período, porque aí teríamos apenas um período de estresse e, na hora em que tudo fosse entregue, passaria a funcionar praticamente ao mesmo tempo. Bem, mas além da verba do PAC, teremos R$ 725 milhões do Estado e R$ 585 milhões da iniciativa privada. Esse é o tripé que compõe a estrutura de orçamento do VLT.
Cezar Santos — Falando sobre a questão dos municípios goianos como um todo, como está a questão dos lixões? Havia prazos a serem cumpridos. O que o governo está fazendo em a isso?
É uma situação totalmente complicada. Tivemos uma reunião com o Ministério do Meio Ambiente no ano passado. Sentamos durante um dia para destrinchar a Lei nº 12.305, que é o Marco Regulatório de Resíduos Sólidos. Na própria lei foram estabelecidos vários prazos que, como você bem disse, não foram cumpridos. Só que há outro aspecto da lei: a punibilidade. A lei fala em cassação de mandato, inelegibilidade e até prisão. Hoje temos em Goiás mais de 120 municípios notificados pelo Ministério Público com relação a resíduos sólidos. O Ministério do Meio Ambiente acabou por fazer um mea-culpa ao nos explicar que fizeram uma ação, no passado, em que chegavam ao município e davam o dinheiro diretamente ao prefeito.


Davam R$ 2 milhões para fazer o aterro, comprar um tra  tor, uma pá carregadeira e um caminhão e falavam para cuidar do lixo da cidade. Isso é lenda. O que aconteceu em 99% dos municípios foi que, a princípio, o governo fez o recomendado. Mas na primeira chuva, o fazendeiro pedia a máquina para arrumar uma estrada vicinal. E, dali, seguia para outra fazenda, e depois outra. E depois nunca mais tal máquina voltava para o aterro, que acabava virando, como virou, lixão a céu aberto. Nas campanhas primárias de 2010 voei praticamente o Estado todo. Teve locais em que pousamos que eram verdadeiros lixões. Aqui mesmo, dentro de Goiânia, inúmeras vezes vi caçambeiros despejando entulho em córregos durante a noite. Quer dizer, não há uma fiscalização eficiente. Os prefeitos, por sua vez, precisam ser responsabilizados por isso. Mas antes precisam ser orientados, e isso eu falei lá no Ministério do Meio Ambiente, que a primeira coisa a se fazer era uma qualificação com a nova turma que iria entrar. É dizer aos prefeitos, “olha, nós vamos aí, vamos fazer um seminário local, orientar, falar sobre a lei, mas também ensiná-los a pescar”. Uma ferramenta de gestão interessante é o consórcio entre municípios. Pegando o exemplo do En­tor­no de Goiânia, vemos Apare­cida com índices terríveis, na área de saneamento e na de tratamento de lixo, piores que os da África do Sul — falo não da África modernizada, mas da interiorizada. Aqui em Goiás temos cidades com índices péssimos, mas, por outro lado, temos também outras com universalização do esgoto, com tratamento de resíduos. O consórcio permite aos municípios fazer uma gestão compartilhada.
Cezar Santos — E isso já está sendo feito?
Já estamos trabalhando. Há três modelos de consórcio já na Secretaria de Cidades e na Secretaria Metropolitana. Sobre o consórcio da região metropolitana, a minuta já está com o dr. Nelcivone Melo, hoje secretário municipal de Desen­volvimento Urbano Susten­tável de Goiânia, para assinar um convênio inicial para tratarmos do projeto do consórcio. A ideia é trazer usinas de tratamento de lixo, sobre o que já há inúmeros projetos no exterior. Nesse sentido, por exemplo, o prefeito de Aparecida de Goiânia, Maguito Vilela (PMDB), esteve em Londres e nos Estados Unidos para conhecer projetos. Temos de achar soluções, porque de agora em diante isso passa a ser responsabilidade civil do gestor. A sanção não irá para um funcionário, vai direto para o prefeito. Vou dar o exemplo de Trindade, onde o prefeito Jânio Darrot (PSDB) enfrenta vários desafios, entre eles o lixão do município. Estive com nossa equipe lá, na semana passada, e uma das pautas era o lixão, onde houve uma queima na gestão passada [de Ricardo Fortunato, do PMDB] que foi um verdadeiro drama, com fumaça poluente recheada de metais pesados lançados a céu aberto. Ou mudamos de vez essa cultura ou vamos continuar a sofrer os dramas de países do Terceiro Mundo. Ao contrário disso, em grandes cidades do Brasil e de fora, o lixo tem se tornado um grande negócio. As pessoas estão descobrindo que o lixo passa a ser um objeto de negócio muito rentável, é uma matéria-prima praticamente de graça. Produzimos várias toneladas de lixo por pessoa hoje na Grande Goiânia. E já temos alguns casos interessantes de trabalho com o lixo aqui. Por exemplo, o RSCC, que é o resíduo sólido de construção civil. Já há uma empresa aqui que está recolhendo o resíduo, fazendo a trituração e o tratamento químico e, então, fabricando telhas e tijolos.

E tudo recebendo a matéria-prima de graça.
Cezar Santos — O lixo é o principal problema de nossa região?
Com certeza. E as pessoas não estão se atentando para isso. A Secretaria da Região Metropolitana fez a implantação do Codemetro, que é o Conselho de Desenvol­vimento da Região Metropolitana, do qual por lei fazem parte todos os prefeitos. Estamos agora visitando todos os 20 municípios e fazendo o levantamento das necessidades. Já estamos também com a minuta de lei da Câmara Deliberativa de Saneamento e Resíduos Sólidos, que vamos mandar para a Assembleia Legislativa. Com isso, o órgão terá autoridade deliberativa, como hoje ocorre com a CDTC. Teremos uma autoridade metropolitana na gestão dos resíduos, com uma responsabilidade muito maior, com condições de fiscalizar e executar também — a CDTC tem um braço executivo, que é a CMTC [Companhia Me­tropolitana de Transporte Coletivo]. Se a gente tiver um ambiente institucional definido, fica mais fácil para trabalhar a questão. Nada melhor do que trazer os principais atores, que são os prefeitos, para essa discussão saudável. Estamos ainda buscando o apoio da AGM [Associação Goiana dos Municípios] e da Associação de Municípios da Região Metro­po­litana, para que tenhamos um ambiente mais positivo, porque todos sofrem com esse problema — todas as prefeituras indistintamente, inclusive a de Goiânia. No aterro sanitário da capital, há problemas com chorume e outras questões que precisam ser tratadas, como os lixões isolados, sem responsabilidade de ninguém. Se você for até o Parque Cascavel, na parte que chega à Avenida Rio Verde, verá que aquilo ali é uma grande invasão que se tornou um verdadeiro lixão. Vejo frequentemente caçambas descarregando lixo por ali. Se não começarmos a agir, a situação vai piorar também em relação aos lotes baldios, por exemplo.

Frederico Vitor — No Entorno do DF, essa questão também é muito séria...
Eu acho que é o maior problema do Brasil, juntamente talvez com a área metropolitana do Recife e algumas áreas localizadas na Grande São Paulo. O problema é um gargalo ainda mais grave ainda no Entorno sul, em cidades como Valparaíso, Novo Gama, Cidade Ocidental, Jardim Ingá, Luziânia. Lançam resíduos diuturnamente, sem qualquer controle. Isso sem falar nos resíduos do Distrito Federal que são jogados em Goiás, o que é outro absurdo. Mas há uma proposta adiantada de consórcio e que já passou nas câmaras de vários municípios. Depende agora de o projeto ser enviado pelo governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz (PT), à Câmara Distrital para aprovação. Não vejo outra forma de fazer esse trabalho sem ser como consórcios. Os municípios não têm capacidade técnica para desenvolver projetos ou fazer a gestão. Cansei de ouvir, nos ministérios, a seguinte frase: “Secretário, o problema não é verba, é projeto.” Os municípios não têm capacidade de apresentar um projeto conceitual, os elementos do projeto básico. Estamos desenvolvendo um núcleo de desenvolvimento de projetos para dar suporte aos municípios. Ou será assim ou eles terão de criar uma secretaria que cuidem especificamente disso.
Elder Dias — Por falar em projetos, quais outros de relevância estão em curso na secretaria?
Estamos com dois projetos muito importantes. Um deles é a revitalização da Praça Cívica, que já está pronto e o qual o prefeito Paulo Garcia teve a gentileza de nos pedir o projeto para colocar no PAC das Cidades Históricas. A exemplo do que foi feito no entorno do Estádio Serra Dourada, provavelmente este será outro a ser desenvolvimento a quatro mãos. A praça será devolvida ao cidadão e o estacionamento será restrito a carros oficiais. Vai sair aquele prédio antigo da Prefeitura [o Palácio das Campinas] e a área se tornará um grande bulevar. O outro projeto é o Parque da Serrinha, uma área que o Estado comprou de uma grande construtora há anos atrás, com estrutura e tudo, e que está sendo, mais do que subutilizada, mal utilizada. A ideia é revitalizar, por exemplo, com uma torre alta que se torne um mirante, uma área de contemplação. É uma experiência diferente.
Elder Dias — Em questão de recursos, a saúde é outro problema sério nos municípios da região metropolitana, especialmente Goiânia. A “ambulancioterapia” é uma prática que acarreta consequências sérias. Existe a possibilidade de minimizar essa situação difícil? Consórcios também poderiam ser efetivados?
Tenho uma viagem programada para Alto Horizonte, um município que tem a particularidade de receber royalties por conta da mineração. Lá, o prefeito resolveu bancar a construção de um hospital regional. Sem sombra de dúvidas, a solução para a saúde é a regionalização. Sem ela, tudo fica mais complicado. Lá em Alto Horizonte, o hospital vai atender os pequenos municípios vizinhos. Em Goiás, 75% dos municípios têm menos de 5 mil habitantes. São pequenas cidades em que a demanda por médico é grave, porque o profissional não quer sair dos grandes centros, onde pode ampliar seus estudos, fazer especializações, e seguir para uma localidade dessas.

Mas, ao mesmo tempo, se essas cidades se organizarem para criar um hospital regional, a exemplo de Alto Horizonte, isso mitigaria o fluxo migratório para Goiânia. Nosso grande drama está nos 20 municípios da região metropolitana. Sobre a questão da dengue, só adianta se houver uma ação conjunta de todos, não dá para pensar em ações segregadas de Aparecida, de Goiânia, de Goianira etc. Nessa perspectiva, estamos também trabalhando no Plano Diretor da Região Metropolitana. Plano diretor não é só parcelamento de solo, mas quando se fala disse por aqui só se pensa em empresas construtoras, imobiliárias, vereadores e parcelamento. Mas plano diretor é para dirigir várias questões do município em muitos aspectos. É claro que há hoje várias questões que são relevantes, como a da verticalização em Goiânia. Conheço pessoas que demoram até 20 minutos para sair da garagem de seu prédio naquela região à direita do shopping Flamboyant. Por que isso ocorre? Porque não foi feito um estudo de impacto de vizinhança, de impacto no trânsito. Simplesmente foram fazendo arranha-céus, sem pensar que na ocupação deles. Há condomínios aqui na cidade que têm mais de 6 mil moradores, muito mais do que a maioria dos municípios goianos. Então, como ficam  questões como saneamento, trânsito, meio ambiente, impermeabilização do solo? Ou partimos realmente para discussões mais produtivas ou chegaremos a um gargalo muito grande na gestão metropolitana. Não dá mais para pensar em Goiânia sem pensar no impacto que ela causa em seu redor e vice-versa, a capital é a caixa de ressonância de toda a região. Outro dia se falou na Via da Paz, entre Aparecida e a capital, como alternativa ao tráfego intenso da BR-153. Tudo bem, mas será que pensaram no impacto de meio ambiente, em ciclovias, em equipamentos urbanos ao longo dela? Essa via atenderia aos novos requisitos de acessibilidade e mobilidade? Não adianta criar uma via para os carros, por isso é necessária a discussão em termos metropolitanos. Outro aspecto: a questão do hospital de urgências. Poderíamos ter um Hugo a cada 20 municípios em Goiás, o que desafogaria a unidade da capital.
Fonte: Jornal Opção