Um VLT para fazer a coisa entrar no Eixo

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Veículo leve sobre trilhos foi a alternativa do governo estadual para suprir a demanda saturada da linha da Avenida Anhanguera. Edital de licitação deve ser publicado nas próximas semanas
Passado, presente e futuro da Avenida Anhanguera: no alto, o primeiro ônibus a circular no Eixo e suas antigas palmeiras; na foto do meio, a via já com o corredor exclusivo; e a projeção do VLT em computação gráfica


Elder Dias
Em 2015, mesmo sem ter recebido a Copa do Mundo, Goiânia poderá contar com uma tecnologia inovadora em termos de transporte público no Brasil: se tudo correr dentro do cenário ideal — e é exatamente nessa questão que, pela burocracia, todo prazo é descumprido —, os ônibus do Eixo Anhan­guera estarão dando lugar ao veículo leve sobre trilhos (VLT), algo que, explicando de modo mais simples, seria um sistema entre o BRT (sigla para “bus rapid transit”, ex­pres­são inglesa para “trânsito rápido de ônibus”) e o metrô.
O Eixo Anhanguera é atu­almente a única linha do transporte coletivo de Goiânia sob responsabilidade estatal. É o governo de Goiás que gere as políticas para a via, incluindo-se o valor da tarifa, que é subsidiado — hoje o usuário do eixo paga R$ 1,35 por viagem, a metade do preço praticado no restante do sistema. Por­tanto, a decisão de trocar o que hoje, na prática, é um BRT pelo VLT é totalmente bancada pelo Estado.
Os estudos para a implantação da novidade estão na fase conclusiva e um importante passo foi dado na quarta-feira, 19, com a apresentação de um relatório elaborado em conjunto por diversas pastas da Prefeitura de Goiânia, cidade que abriga toda a extensão atual do eixo, de 13,6 quilômetros, entre o Ter­minal Padre Pelágio, na saída para Trindade, e o Terminal Novo Mundo, na região leste da capital.
O relatório da Prefeitura foi solicitado pelo Estado. A reunião de apresentação trans­correu em clima amistoso, com os representantes do governador recebendo as observações dos técnicos mu­nicipais com atenção e solicitude. Pela Prefeitura, falaram técnicos dos órgãos: Com­panhia Metropolitana de Transportes Coletivos (CMTC), Agência Municipal do Meio Ambiente (Amma), Procura­doria-Geral do Município, Se­cretaria Municipal de Planeja­mento e Urbanismo (Seplam), Amob (Agência Municipal de Obras Pú­bli­cas), Agência Municipal de Trânsito, Trans­portes e Mo­bilidade Urbana (AMT) e Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econô­mico (Sedem).
Todos citaram a importância do projeto, e indicaram melhorias e complementos em cada área, além da avaliação do impacto que a obra causará na cidade, as oportunidades que ela geraria e medidas mitigadoras. Uma questão se destaca entre as preocupações apontadas: foram anotados dez pontos vulneráveis a alagamentos no trajeto do futuro VLT Anhanguera — enquanto os ônibus enfrentam com certa tranquilidade essas barreiras, a submersão dos trilhos causa a interrupção imediata do serviço de trem. A partir disso a Amma, responsável por essa parte do documento, recomendou intervenções para sanar o problema.
Iniciativa privada
O governo admite: sem o reforço da iniciativa privada seria inviável pensar em uma solução como o VLT. A co­meçar do investimento, que será de pelo menos R$ 1,3 bilhão, segundo as contas do Estado.  “O VLT só poderá realizado a quatro mãos”, resume o secretário das Ci­dades, Silvio Silva Sousa. De fato, a parceria já começou há um ano e oito meses, quando um decreto autorizou um grupo privado — composto de um operador local, uma construtora nacional e um consultor internacional — a desenvolver um procedimento de manifestação de interesse (PMI) para desenvolver os estudos relativos ao veículo sobre trilhos.
Pela divisão do bolo, a União vai repassar R$ 215 milhões —metade do valor recebido pela Prefeitura no PAC da Mobil­idade Urbana; R$ 300 milhões virão do alargamento da dívida, que vai ser operado pelo Banco Nacional de Desenvol-vi­mento Econômico e Social (BNDES); outros R$ 200 milhões serão disponibilizados a partir do Fundo Es­tadual para o VLT, que será regulamentado pelo grupo executivo. Ao todo, R$ 715 milhões de origem governamental. Para completar o R$ 1,3 bilhão, mais R$ 585 milhões do setor privado, algo que pode chegar a R$ 650 milhões. “Quem oferecer a menor contraprestação para o Estado, ganha a concorrência”, diz Silvio. 
Por que não o BRT? E o metrô, como fica?
Uma comparação inevitável que fica é entre os dois modais que pretendem transformar o jeito de se locomover em Goiânia: de um lado o BRT Norte-Sul, bancado pela Prefeitura em um trecho de 21,7 quilômetros entre o Setor Recanto do Bosque, na região noroeste da capital, ao Terminal Cruzeiro do Sul, já em Aparecida de Goiânia; perpendicular ao primeiro, o VLT do Eixo Anhanguera, com a maior demanda de usuários do transporte coletivo de toda a região metropolitana — cerca de 240 mil passageiros diariamente. O BRT tem uma extensão maior e ainda assim é bem mais barato. A pergunta que fica para o cidadão: por que optar pelo VLT e não pelo BRT?
Técnico dos mais respeitados em mobilidade urbana, o presidente da Companhia Metropolitana de Transportes Coletivos (CMTC), José Carlos Xavier, o Grafite, acredita que a questão precisa sair da mera disputa de projeto. “Não existe essa questão de colocar um como melhor do que o outro. Uma rede de transporte exige multimodalidades. O VLT não vai resolver nenhum problema sozinho. Vai, isso sim, complementar as soluções necessárias para as demandas da cidade”, avalia.
Para Grafite, o governo teria três possibilidades de tecnologia de transporte para adotar no Eixo Anhanguera: uma atualização do BRT já existente, com inovações como a possibilidade de ultrapassagem nas estações, a adoção apenas de veículos biarticulados e o resgate do paisagismo da via; uma segunda alternativa seria o monotrilho, com pista elevada e veículo ferroviário, desimpedindo totalmente o trânsito; e, por fim, o VLT, que foi a opção aprovada.  “Mas isso é discussão ven­cida, o que precisamos é de construir as condições para implantar o VLT”, alertando para o fato de que o projeto executivo precisa apontar soluções, como para a questão da drenagem dos pontos com risco de alagamento.
O presidente da CMTC aponta dois trunfos do VLT: a vantagem de ser um veículo movido por uma fonte de energia relativamente limpa, a eletricidade; e a maior vida útil dos equipamentos ferroviários em relação aos ônibus. “Nesse sentido, temos de admitir que o VLT tem vantagens sobre o BRT”, admite.
Silvio Silva Sousa, ocupante da Secretaria das Cidades, diz que o passo dado pelo governo é do tamanho exato. “Estamos operando hoje na capacidade limite. O Eixo Anhanguera já não suporta mais a demanda. Os ônibus saem minuto após minuto, não tem mais como colocar novos veículos na linha. O problema é que eles acabam juntos, é um comboio de ponta a ponta”, relata. O “transit time” — medição do tempo do ponto de origem ao destino — marca 78 minutos no horário de pico do Terminal Padre Pelágio ao Novo Mundo. Com o VLT, a perspectiva é de que a viagem dure menos de 50% disso — 34 minutos, com uma velocidade média de até 25,5 km/h.
O problema não era tão grave assim há pouco tempo. “Se retrocedermos dois anos, antes dos novos ônibus, o nível de insatisfação era altíssimo. Melhoramos esse nível de satisfação, com os 90 ônibus novos. Mas a demanda aumentou e assim continua. Precisamos do VLT para supri-la”, raciocina Silvio Sousa. Para tanto, os ônibus serão substituídos por 32 trens, com saídas intervaladas a cada três minutos. A lotação dos automotores biarticulados é de 180 passageiros; a de cada trem, de 600. Um número que faz o governo projetar suprimento da demanda até 2040.
Mas, se é para fazer um em­preendimento desse porte, por que não ir direto para o metrô? Por uma série de fatores. O primeiro é o custo: cada quilômetro de metrô pode custar até dez vezes mais que o do VLT. “E o nosso projeto tem uma demanda que atrai a iniciativa privada. Hoje, ninguém vai bancar um projeto de metrô na Avenida Anhanguera, o custo é inviável. Foi o que eu disse, por exemplo à deputada Isaura Lemos [defensora ostensiva do metrô] em uma audiência pública, dando um exemplo da área dela, a moradia: ‘O que é melhor, conjunto habitacional ou condomínio fechado? O condomínio fechado. Mas o que o Minha Casa Minha Vida dá conta de fazer para as pessoas? O conjunto.’ O custo pesa muito”, diz Silvio.
Outra questão seria o transtorno gerado: enquanto o VLT promete interromper apenas um trecho de 200 metros por vez da avenida para a execução das obras, por um prazo relativamente exíguo (15 dias), o metrô seria uma intervenção profunda, literalmente até. Grafite vê ainda outra questão. “O metrô não deve ser impositivo em uma política de mobilidade urbana. Há cidades, como São Paulo, por exemplo, em que ele passa a ser obrigatório em um determinado momento. Mas Goiânia tem todas as condições de se estruturar de modo a nunca precisar de um metrô”, diz o presidente da CMTC.
Licitação
A intenção do governo era de lançar o edital de licitação do VLT ainda nesta semana, o que parece pouco provável, mas deve ocorrer em breve, de qualquer forma. Para a concorrência, a previsão é de que poucos grupos se inscrevam, por causa da alta especificidade da obra. Silvio Sousa acredita que se formarão consórcios, já que há poucas empresas que operam e apenas três delas de material rodante (fabricante dos veículos) — uma alemã, outra australiana e uma terceira, francesa. Para a obra de engenharia civil e urbanística, por sua vez, há muitas empresas concorrentes em potencial. “É um projeto economicamente atrativo, e que, além da obra de engenharia, não pode ser visto apenas sob o viés do custo direto dos trens. O preço tem de englobar itens como assistência técnica, rede de concessionárias, qualidade, histórico da empresa, acesso a peças de reposição, pós-venda etc.”, informa Silvio. São os custos agregados, que ou mitigam ou aumentam o valor inicial. “No caso de uma compra malfeita, o barato vai sair caro.”
O edital de licitação deixa muito claro os critérios de bitola, nível de conforto e regularidade dos trens e está sendo redigido de acordo com as melhores experiências dos 48 projetos de VLT que já rodam pelo mundo, assegura o secretário das Cidades. 

Fonte: Jornal Opção

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Adriano Reis
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25 de dezembro de 2012 às 18:24 delete

Há várias empresas que fabricam o material rodante, mais do que as três citadas. Temos a Siemens, alemã, a Ansaldo-Breda, italiana, a Bombardier, canadense, a Alstom, francesa, a CAF, espanhola, a Vossloh e por aí vai...

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