É difícil deixar o carro em casa
Galtiery RodriguesO trânsito de Goiânia chegou a um ponto que não dá mais para esperar. Especialistas afirmam que medidas eficazes precisam ser tomadas com urgência e o tempo perdido pode significar em mais incômodos e aumento dos problemas já enfrentados. Especialmente hoje, diversos órgãos públicos resolveram se mobilizar com iniciativas em comemoração ao Dia Mundial Sem Carro. Até o governador em exercício, José Éliton (DEM), vai pedalar da Tamandaré até a Praça Cívica. Contudo, a bicicleta e o ônibus, que seriam as principais alternativas ao carro, sofrem com a falta de espaços específicos e com o trânsito congestionado da capital.
Envolto de reflexões e ideias – afinal todos têm opinião, pois lidam com ele diariamente –, o trânsito de Goiânia vive crise estrutural, que inviabiliza o tráfego tranquilo de ciclistas e a fluidez do transporte coletivo. A bicicleta só é encarada por quem se propõe a enfrentar o perigo das ruas e avenidas da cidade, cada vez mais movimentadas, e a lidar com a inexistência de ciclovias, enquanto os que andam de ônibus sofrem com a lentidão e atrasos por causa do trânsito congestionado de exatos 1.011.811 veículos, conforme o Detran-GO. Em 2010, foram registrados 4.190 acidentes de trânsito em Goiás envolvendo ciclistas. Só em Goiânia foram 938.
O coordenador regional da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP) e superintendente de Desenvolvimento Urbano e Trânsito da Secretaria das Cidades, Antenor Pinheiro, verifica que enquanto não mudar a postura das ações tomadas pelos órgãos responsáveis pelo trânsito, a população vai continuar a optar preferencialmente pelo carro. “As intervenções feitas no traçado, como cortar praças, construir viadutos, túneis e aumentar faixas, todas são medidas para corresponder às demandas de automóveis. A gestão do trânsito de Goiânia está na contramão do incentivo ao transporte alternativo”, expressa.
A questão cultural também é pontuada por Antenor como entrave, mas a crise estrutural é o principal obstáculo. No Brasil, segundo ele, existem apenas 700 quilômetros de ciclovia, enquanto em uma única cidade, como Bogotá, capital da Colômbia e com apenas 6 milhões de habitantes, são quase 400 quilômetros. Pinheiro diz que as ciclovias brasileiras correspondem a apenas 0,15% da quilometragem viária do País, mesmo que a frota de “magrelas” no Brasil já ultrapassa os 25 milhões. Em Goiânia, são 210 mil bikes. “A diferença é que o carro tem os seus espaços e a bicicleta, não. Isso consolida no imaginário da população que a melhor forma de se transportar é de carro mesmo”, argumenta.
Alguns grupos de ciclistas já se organizam e reivindicam por melhorias e reserva de espaços. Um deles, o Pedal Goiano, acompanha de perto a evolução do pedido já feito ao prefeito de Goiânia, Paulo Garcia (PT). Ciclofaixas chegaram a ser instaladas em locais específicos da cidade, durante os finais de semana, e mesmo assim são constantes os flagras de automóveis que invadem o espaço mediado pelos cones. “A mobilização é forte e eu só penso que a mudança só será possível se todos cobrarem. Governo e feijão, já dizia Frei Beto, só funciona na pressão”, brinca Antenor.
Cultura enraizada
O doutor em transportes pela Universidade de São Paulo (USP) Benjamin Jorge Rodrigues dos Santos acredita que o goianiense ainda não está preparado para uma mudança brusca. Assim como Antenor Pinheiro, ele mensura o quão enraizada está a “cultura do uso do automóvel” e, pior, os motoristas são tais que a falta de educação e conscientização no trânsito, são constantes. Para ele, o processo deve ser paulatino e já tinha de ser iniciado de modo mais incisivo. E, claro, paralelo a isso, um trabalho forte de convencimento e conscientização.
Fonte: Jornal o Hoje