‘É impossível cumprir o horário’, diz presidente da CMTC

22:51 0 Comments A+ a-


“Os problemas são estruturais”, assegura José Carlos Xavier, o Grafite, presidente da CMTC, ao analisar o entrave vivido pelo transporte público da região metropolitana. Segundo Grafite, já não adianta colocar mais ônibus no trânsito. Ele aposta em corredores exclusivos de ônibus para otimizar o a circulação. “Nenhuma grande cidade deveria ser planejada para ter sua mobilidade urbana assentada no transporte individual”, alega.

PERFIL: José Carlos Xavier Grafite, de 56 anos, é engenheiro civil formado pela Universidade Federal de Goiás (UFG), com especialização em Planejamento de Transportes pela Empresa Brasileira de Transportes Urbanos (EBTU). Já dirigiu vários órgãos municipais e nacionais ligados ao transporte. É presidente da CMTC. Casado, é pai de dois filhos e avô de dois netos.

Rogerio Leandro - Recentemente tem-se falado muito da atuação dos fiscais da CMTC nos terminais. Dentro do que foi falado está às condições de trabalho, o desvio de função e até mesmo o baixo salário. Quero saber por que o salário dos fiscais da CMTC não tem reajuste há mais de 6 anos? A CMTC pensa em alguma mudança na atuação deles?

A atividade da CMTC não é só fiscalização, mas de planejamento também. A fiscalização tem requisitos próprios e um regulamento que a norteia que diz respeito a cumprimento de horários, qualidade dos veículos, qualidade e postura do condutor. Uma outra atividade da CMTC é o controle do terminal, que é feito em conjunto com o consórcio da Rede Metrolitana de Transportes Coletivos (CMTC). A atividade de fiscal não se confunde com o controle de terminal, que são as filas, a harmonia, a constituição do ambiente. Com relação ao corpo fiscal da CMTC, houve um concurso público em 2010. Portanto, não há uma defasagem salarial de seis anos, uma vez que o valor do salário e as condições de trabalho f oram fixados pelo regulamento e consolidado dessa forma a partir de 2010. Agora, temos um quadro de fiscais, previsto em 43 vagas, em constante mutação. Já convocamos desse concurso 91 aprovados e temos hoje um quadro menor do que as 43 vagas. A rotatividade é grande porque o cidadão chega na expectativa de um novo concurso e quando é aprovado, pede para sair. Há necessidade de aprimoramento e isso vai ser feito.

Flávio Santos - O plano diretor de Goiânia de 2007, no artigo 29, § 1º, trata da implantação de corredores exclusivos para o transporte coletivo em seis vias arteriais da cidade. As vias que, pela lei, devem receber a implantação dos corredores exclusivos são: T-9, T-7, Mutirão, Leste-Oeste. Porém, foi anunciado a implantação do corredor Norte-Sul, que não estava previsto no plano. Há previsão ou projetos, de implantação de corredores exclusivos nas vias citadas?

Como nossa rede é metropolitana, transcende os limites de Goiânia. As soluções requeridas envolvem atores que não são regidos apenas pelo plano diretor de Goiânia. A parte de Goiânia obedece o plano diretor da capital e as dos demais, ao de seus municípios, sempre harmonizando com Goiânia. O corredor Norte-Sul passa por uma série de avenidas, como as Avenidas São Paulo e Rio Verde, no limite de Goiânia e Aparecida de Goiânia, Avenidas 90, 84, Goiás e Goiás Norte até o Recanto do Bosque. Esse corredor, o BRT Norte-Sul, está em harmonia com o plano diretor. Ele está sendo proposto pela Prefeitura de Goiânia com recursos federais, obtidos junto ao Banco Andino. Pela primeira vez a administração municipal se envolve no transportes e com investimentos significativos no transporte urbano. Estão previstas vias arteriais em que a densidade pode ser alterada adequadas.Como ele é de exclusividade do transporte coletivo, possui uma série de atributos como sinalização eletrônica, controle semafórico e embarque pré-pago nas estações. As demais vias arteriais serão tratadas em outro projeto.

Fabrício Arruda - A CMTC vem falando que vai implantar corredores para ônibus. E os carros, vão poder usar essa pista? Como será feita essa fiscalização?

O BRT impede o compartilhamento da via por outro tipo de veículo. A exceção é somente para os óbvios, como carros de polícia e do Corpo de Bombeiros e ambulâncias. Já os corredores preferenciais, que são à direita, permitem ocasionalmente o compartilhamento com os veículos para acesso local e conversões à direita, mas somente nessas duas situações. É bom lembrar que o trânsito nessas vias já é muito saturado. Temos a oportunidade com esses projetos, especialmente dos 102 km de corredores preferenciais, de organizar o trânsito. Isso vai influenciar na redução do tempo da viagem e numa oferta maior também. É essencial para a qualificação do transporte coletivo a conclusão do projeto do corredor Norte-Sul, os corredores preferenciais nas vias arteriais e a instalação do Veículo Leve Sobre Trilho (VLT) no Eixo Anhanguera pelo Estado. As maiores mazelas do transporte coletivo de Goiânia, com efeito na lotação dos veículos e no tempo longo de viagem, estão na sua não priorização no sistema viário da cidade.

Denise Cristina Bueno - Sou usuária do transporte e vejo que o serviço tem falhas. O que poderia ser feito para que o serviço esteja em harmonia com a população. Campanhas ajudariam a melhorar a relação que hoje existe entre usuário e motorista?

Há um esforço da CMTC para criar uma interação entre a sociedade e o sistema. Temos um serviço gratuito, o 0800 641 851, que pode ser acionado para sugestões e eventuais reclamações. Apesar de alguns momentos trágicos, quando dois passageiros foram vitimados, entre maio e julho, o número de sugestões e de perguntas sobre horários superou o número de reclamações. Mas há necessidade de outros mecanismos, como a criação de um conselho comunitário de transportes, como já houve no passado. O motorista precisa ser treinado para atender a população.

Rafael Martins - Os veículos convencionais andam superlotados e não atendem toda a demanda de passageiros. Já não é hora de colocar ônibus articulados e biarticulados, que tem grande capacidade, e implantar definitivamente o BRT?

Há uma relação direta entre os veículos biarticulados e os corredores exclusivos. Eles são adequados para as grandes demandas e as faixas segregadas, que eles tenham exclusividade. Pensar num veículo biarticulado rodando por uma via normal, em conflito com o trânsito, não terá a mesma eficiência. Os problemas são estruturais. Não basta colocar ônibus em conflito com automóveis para obter resultados satisfatórios.

Graziele Ribeiro Pessoa - O tempo de espera pelo ônibus irrita nós usuários. Ligar para a Ouvidoria da CMTC resolveria o problema?

É praticamente impossível hoje, na região metropolitana de Goiânia, garantir que os intervalos previstos sejam rigorosamente cumpridos. Toda situação tem de ser relatada à Ouvidora da CMTC ( 0800 646 1851 ) para que as variáveis sejam consideradas no planejamento da linha. É importante que a população relate esses problemas.

Sejana Nascimento - No Rio de Janeiro já fizeram dois corredores exclusivos para ônibus e a iniciativa deu certo. Quantos corredores a CMTC quer implantar em Goiânia e qual o ganho em velocidade essas ruas e avenidas vão dar para o transporte?

Os corredores exclusivos - os BRTs - fornecem um ganho imenso à velocidade operacional. No corredor Norte-Sul, que hoje tem velocidade em torno de 15 km/h, chegará com o BRT em operação ao dobro, o que vai reduzir o tempo de viagem à metade. Nos corredores preferenciais, pela necessidade de compartilhamento com o tráfego em geral, esse ganho não é tão significativo, mas é expressivo. Em vias como a T-9 e T-7 que a velocidade está hoje na faixa de 14 km/h, podemos chegar a ter velocidade média de 20 km/h. Além disso, o BRT Norte-Sul, cujo projeto executivo já foi contratado e a licitação vai sair ainda este ano pela Prefeitura de Goiânia, será importante para qualificar o transporte público de Goiânia.

Angélyca Paula - Sou usuária do transporte coletivo e li no jornal que a CMTC e AMT querem proibir estacionamento na Avenida Anhanguera para priorizar o transporte coletivo. O senhor acredita que isso vai dar mais agilidade para o transporte?

A Avenida Anhanguera é uma situação particular. Não há projeto de suprimir estacionamentos na via, o que há é a necessidade de sua ampliação em alguns pontos para permitir a ultrapassagem dos ônibus nos pontos de parada, visando a agilidade da operação. Talvez, pontualmente, seja necessário retirar o estacionamento, mas não em toda a avenida. O sistema viário de Goiânia não foi planejado para esse tamanho de frota de veículos individuais, aliás nenhum do mundo. Indo na origem do problema, nenhuma grande cidade deveria ser planejada para ter sua mobilidade urbana assentada no transporte individual. O planejamento adequado de qualquer cidade deveria considerar a possibilidade de um transporte coletivo de qualidade, calçadas adequadas para as pessoas se deslocarem, um favorecimento ao uso de bicicletas para um clima mais saudável.

Pettra Sapeixoto - Já morei em Nova York e Londres. Nessas duas grandes há um código de conduta por parte da população que colabora para que o serviço seja oferecido com qualidade. Ouço pessoas dizerem que o transporte em Goiânia e em outras capitais não é bom. Para dar esse salto, além de investimentos, qual seria a participação do usuário e sua responsabilidade na discussão sobre cidades?

A participação do usuário através dos mecanismos de organizações que a sociedade dispõe, como sindicados e associações, é muito importante para discutir como a cidade deve caminhar. As demandas do transporte coletivo não são estruturadas da mesma forma que as demandas da fluidez do automóvel. As demandas para o transporte chegam de forma desarticulada, falam da tarifa, da superlotação, que é real, mas não chegam dizendo que o transporte é essencial para a cidade funcionar.

Tenho dito que criticar o transporte coletivo da janela do carro não contribui para que ele melhore. Ela chega com viés para justificar o uso do transporte particular, mas reivindica soluções para o carro, não para o transporte coletivo. Enquanto estivermos drenando a maior parte dos recursos públicos para financiar o transporte individual não teremos transporte coletivo adequado.

Fonte: O Popular