Pronta para virar um canteiro de obras
Até 2016, a capital goiana poderá ter resolvido o problema de vagas para a educação infantil, a pavimentação será uma realidade para todos e a mobilidade urbana terá sido reconquistada. Basta que haja bons projetos e respeito ao planejamento
Elder Dias
Foi o próprio principal candidato da oposição, Jovair Arantes (PTB), que disse, em sua última entrevista ao Jornal Opção (edição 1933): “Goiânia nunca teve prefeitos desastrosos.” De fato, observando-se com um olhar retrospectivo, não pode se dizer que a capital do Estado teve alguma administração que levasse o município à ruína. Pelo contrário, cada um a seu modo, os gestores deram contribuições positivas ao desenvolvimento da cidade.
Não será diferente nos próximos quatro anos. Muito além do resultado das urnas e de quem estiver na principal cadeira do Paço, o processo de construção de Goiânia não será interrompido. Ainda que a visão do goianiense seja criticamente negativa com alguns aspectos da vida urbana e apesar da obviedade de alguns gargalos — especialmente o do trânsito/transporte/mobilidade urbana —, não há um caos instalado na capital, o que favorece a implementação de ações proativas em vez de se perder tempo com medidas corretivas.
E ações proativas, no caso da próxima gestão, têm tudo a ver com muita obra: tudo indica que o próximo prefeito será o mesmo prefeito — no fechamento desta edição, Paulo Garcia (PT) liderava com folga cada vez maior, em termos de votos válidos, as derradeiras pesquisas de intenção de voto e só uma mudança muito drástica levaria a eleição de Goiânia para o segundo turno — e são exatamente isso (muitas obras) o que prevê o plano de governo da coligação Goiânia Sustentável.
É possível dizer duas coisas: a primeira é que, sim, as promessas de campanha que parecem absurdas à primeira vista podem ser cumpridas; a segunda é que será preciso uma mudança total no ritmo da gestão e na forma de conduzi-la para que isso ocorra. Se tudo der certo, Goiânia vai se transformar em um canteiro de obras em que o aviso do governo Iris Rezende — “Os transtornos passam, os benefícios ficam” — vai se banalizar, em itens como ciclovias, escolas, hospitais, CMEIs, pavimentação, corredores exclusivos, viadutos e muito mais.
O “se tudo der certo”, porém, depende de algo que, na aparência, seria tranquilamente possível e até óbvio, mas que não é a tradição das administrações públicas executivas no Brasil: o planejamento e a organização para efetivar as obras, reduzir o desperdício e anular a perda de receitas possíveis.
Escritório de projetos
A primeira medida que teria de ser tomada para que Goiânia pudesse avançar o máximo possível nos próximos quatro anos é a mesma que 99% das gestões municipais Brasil afora também deveriam providenciar para desatravancar seus passos: um ataque contra a falta de mobilidade dos processos administrativos. Somente com a minimização da burocracia é que os recursos disponibilizados poderão ser aproveitados ao máximo. Palavras mágicas que englobam três das seis estratégias de atuação governamental previstas no plano de governo da coligação puxada pelo petista: “fazer mais com menos”, “governo de parcerias” e “governo ágil e desburocratizado”.
Em outras palavras, como se costuma dizer na linguagem popular, são metas para uma cidade que precisa de um “choque de gestão”. E dentro da atual administração da própria Prefeitura, há muita gente que não vê outra saída que não uma atenção prioritária a esse aspecto, que englobaria várias condicionantes. Talvez a mais importante delas seja a captação máxima de recursos exteriores aos cofres da Prefeitura, com atenção especial a verbas possíveis do governo federal e de organismos exteriores — como foi o caso dos recursos do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), obtidos para a execução do projeto Macambira-Anicuns.
A verdade é que, se for depender dos recursos do município apenas, nenhum eleito daria conta de executar muita coisa. O grosso das verbas vem mesmo da União e boa parte delas se perde (ou pelo menos não se obtém) — pode incrível que pareça, mas é isso — por falta de projetos.
No plano de governo para o futuro mandato de Paulo Garcia consta a criação de um “escritório de projetos” para tornar mais eficiente a captação de recursos do governo federal e de órgãos de financiamento do exterior. É algo que aparentemente pareceria óbvio, mas que até hoje não foi levado a sério na administração municipal: há “sustos” no Paço no que diz respeito a prazos finais para inscrição de projetos que poderiam trazer recursos simplesmente se fossem apresentados de forma correta. Com certeza, por falta de uma melhor gestão, já se perderam várias oportunidades de inserir Goiânia em bons programas, para muitas áreas — algo que, ao que parece, pelo menos tem sido corrigido nos últimos meses, com uma atenção melhor e pessoas trabalhando quase que exclusivamente para essa finalidade.
Goiânia 2016: uma cidade toda asfaltada e sem problema de escola
A maioria das últimas pesquisas de intenção de voto indicava, no fechamento desta edição, que, na segunda-feira, 8, Paulo Garcia já estaria pensando na composição e nos desafios de um novo mandato, o que daria ao prefeito as condições de já encaminhar demandas que se impôs como candidato e que qualquer outro concorrente que porventura o vencesse só poderia iniciar em 2013.
O fato é que, com a vitória nas urnas, Paulo Garcia tem, na verdade, um mandato de praticamente quatro anos e três meses. Pode parecer muito tempo, mas, diante das metas do plano de governo, o desafio é enorme: são 40 mil casas — ou 27 casas por dia durante os quatro anos de mandato; 81 CMEIs [centros municipais de educação infantil], mais de dois e meio por mês até 2016; pavimentação asfáltica em dezenas de bairros; 10 viadutos como alternativa para desafogar o saturado trânsito da capital; e 14 corredores exclusivos para o transporte coletivo, para ver se o goianiense começará a pensar em trocar o carro pelo ônibus; e mais de 100 quilômetros de ciclovias, na tentativa de inserir um novo (e sustentável) modal para a circulação por toda a capital.
Para efetivar o que está previsto no plano de governo, a administração terá de tornar Goiânia um canteiro de obras durante quatro anos. Mas o que está mais próximo de ser efetivamente realizado? Aquilo que já está com a chamada “verba carimbada”, isto é, dinheiro já dirigido para a execução de um projeto aprovado.
No caso da capital, pode-se dizer que, ao contrário do que adversários tentaram fazer com ataques durante a campanha eleitoral, Paulo Garcia tem plenas condições de fechar seu mandato com a quitação de dois importantes compromissos para a qualidade de vida da população: os 81 CMEIs e a pavimentação de todos os bairros da capital.
Ambas as metas já estão com projetos aprovados e boa parte das licitações finalizadas, aguardando apenas o fim do período eleitoral — em que não se pode iniciar nenhuma obra, em observação à legislação. A previsão inicial é de que os 31 bairros que deverão receber asfalto serão contemplados com o benefício até março.
Sustentabilidade
De forma coerente, assim como ocorreu na propaganda eleitoral, também no plano de governo de Paulo Garcia o centro da preocupação é a sustentabilidade. São mais de 80 projetos, a maior parte voltados para a área social, com foco na saúde, na educação e na cultura. A intenção é fazer o desenvolvimento urbano com um conceito que é consenso e tendência entre os urbanistas: o modelo de cidade compacta, promovendo um redesenho que transforma cidades “industriais” em “pós-industriais”, conforme relata o chefe de Gabinete da Prefeitura, Nelcivone Melo. “É uma situação presente em espaços urbanos de cidades como Bilbao e Barcelona, na Espanha.”
A intenção é fazer com que Goiânia se adeque a esse modelo de desenvolvimento. Para isso, será necessário conter a pressão para expansão em áreas circunvizinhas. Chegará uma hora em que o interesse público e o planejamento requererá bater de frente com a ambição, por exemplo, do setor imobiliário, muito forte e presente no governo do PMDB de Iris Rezende. A expectativa é de que conquistando mandato com amplo apoio, ainda no primeiro turno, o petista tenha muito mais legitimidade para fazer a gestão de acordo com a proposta e o conceito de sustentabilidade, que foi avalizado também por pesquisas qualitativas.
Dessa forma, a Prefeitura iria inverter a lógica de bairros como o Residencial Orlando Morais — entre Goiânia e Santo Antônio de Goiás — e o Jardins do Cerrado, situado quase na divisa com o município de Trindade. Não será fácil: a pressão imobiliária existe e é forte, propostas para parcelamento de áreas rurais chegam toda semana ao Paço. Até o momento, o prefeito tem resistido a aprovar e, se obedecido o que diz o plano de governo, será ainda mais duro com esse tipo de situação.
Análise
Se quiser, gestão poderá deixar legado histórico
Elder Dias
Elder Dias
Jornal semanal tem dessas coisas. Quando esta edição começar a circular, vai também estar se iniciando o dia de votação; pouco depois das 17 horas de domingo, com os levantamentos de boca de urna, já se saberá se a eleição em Goiânia terá ou não terá segundo turno. Se ocorrer a segunda hipótese — conforme apontavam todas as pesquisas sérias —, a população já terá definido o nome para gerir a cidade nos próximos quatro anos: Paulo Garcia, reeleito.
É com esse cenário que trabalho este e os parágrafos seguintes. A reeleição do petista significará, também, a vitória de um discurso nada eleitoreiro: a defesa da sustentabilidade como motor de uma administração pública de uma metrópole. O grande desafio — e para o qual, pelo teor da campanha, o prefeito e seus assessores parecem estar se preparando — é conciliar essa forma adequada de desenvolvimento a interesses por vezes inconciliáveis com qualquer planejamento ambiental sério.
Falo especificamente dos interesses de construtoras, incorporadoras e demais empresas do setor imobiliário, que sempre buscam se atrelar a políticos — exemplos deles há vários na Câmara de Goiânia — de modo a conseguir com que seus objetivos prevaleçam a qualquer custo. Ninguém, e obviamente muito menos o prefeito, tem a ilusão de que o governo se dará à margem da influência e da pressão do setor imobiliário.
O problema é que, para não frustrar o discurso da sustentabilidade, o mesmo que foi apresentado de forma bem sucedida para o eleitorado como plano de governo, será preciso impor regras que certamente atingirão esses interesses. Como deixar prosseguir o adensamento em áreas já saturadas, como a do Jardim Goiás e a do Setor Bueno? Por outro lado, como autorizar prédios em áreas até então pacatas, com moradias de no máximo dois pavimentos, mudando totalmente a rotina e, na prática, aquilo que tecnicamente se chama de grau de incomodidade da vizinhança?
Uma gestão sustentável terá de dialogar (e duelar) com todos os setores da sociedade, mas especificamente com os representantes do ramo imobiliário. E a arena de debate já tem lugar acertado: a Câmara de Goiânia, por ocasião da discussão do Plano Diretor, cuja revisão estaria prevista para 2017 — portanto somente daqui a duas legislaturas —, mas que tem adequações acertadas para ocorrerem a cada dois anos. Resta saber o que vão fazer os vereadores diferenciarem “revisão” (mudança mais profunda) de “adequação” (um acerto mais básico do que já está escrito).
Outra área onde se terá de investir bastante para entregar à sociedade uma Goiânia verdadeiramente sustentável em 2016, quando da prestação de contas do mandato, será a da mobilidade urbana. Para isso é fundamental prosseguir a execução dos eixos exclusivos para o transporte coletivo e, combinada harmonicamente com essas obras, a implementação, enfim, de uma política cicloviária. Se Paulo Garcia chegar ao fim de seu segundo mandato tendo convencido o goianiense a trocar o transporte individual pelo ônibus e a pegar mais vezes no guidão em vez de segurar o volante, já terá dado uma imensa cota de contribuição. Um legado inesquecível para a cidade, pois representará, mais do que qualquer obra física, uma mudança de cultura.
Fonte: Jornal O Hoje