Violência cresce e assusta goianiense
Comparativo divulgado pela Secretaria de Segurança Pública aponta crescimento da criminalidade no último triênio.
Nas ruas e calçadas, caminhe com atenção e afaste-se de desconhecidos. Já no trânsito, quando estacionar, tranque o carro, acione o alarme e não se esqueça de retirar o som. De madrugada, não pare em sinal vermelho. Se for assaltado, não reaja. A série de recomendações pode colaborar com a segurança pessoal, mas não ameniza os efeitos da violência, que deixa a população goianiense refém da insegurança. Os assassinatos, roubos de veículos e assaltos a estabelecimentos comerciais – divulgados pela Secretaria de Segurança Pública de Goiás (SSP) (veja gráfico) – alavancam as estatísticas negativas este ano e apontam para um turbilhão crescente de crimes, ano a ano, sem uma resposta efetiva do poder público.
Pelo menos duas pessoas foram vítimas de homicídio por dia nos três primeiros meses deste ano. Além do crime contra a vida, outros delitos tiram a tranquilidade de quem vive na capital. No período de dois anos, o furto e roubo de veículos em Goiânia cresceram 37,7%. Os lojistas, diante de frequentes assaltos, paramentaram seus estabelecimentos com equipamentos de segurança, mas, mesmo assim, nos últimos anos a quantidade de furtos e roubos nos comércios cresceu 38%. O índice é obtido com base nas comparações dos três primeiros meses de 2011, 2012 e 2013.
Diante da crise na segurança, até mesmo o novo comandante da Polícia Militar, coronel Silvio Benedito Alves, chegou a pedir auxílio divino ao assumir o cargo em março, para atuar contra a criminalidade do Estado. Nos últimos dias, o debate referente à segurança esquentou ainda mais devido o registro de inúmeras execuções de moradores de rua, da possibilidade de um grupo de extermínio e de conflitos e acusações mútuas, entre as polícias Militar e Civil. Enquanto isso, a ação policial restringe-se a atuar com um modelo de repressão bastante criticado por especialistas e estudiosos na área.
Socióloga e professora da Universidade Federal de Goiás (UFG), Dalva Borges de Souza ponta a falta de políticas públicas como um dos principais motivos para a escalada vertiginosa do crime. “O que a gente tem é a presença de policiais nas ruas. Não há uma política de conhecer onde é que cresceu a criminalidade.” Dalva acredita que uma análise detalhada para identificar em quais pontos os crimes acontecem com frequência deveria servir não apenas para uma política repressiva, mas para a elaboração de projetos sociais com resultados em longo prazo.
Sobre os sucessivos assassinatos dos moradores de rua, a especialista afirma que a questão está voltada mais para a necessidade de uma política de assistência social do que de segurança. “Apreensão de faquinhas que eles devem utilizar para cortar droga, apreender uma quantidade mínima de droga, não resolve.”
A também socióloga e professora da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO) Eline Jonas aposta em ações conjugadas para barrar o crescimento da violência. “É preciso de política públicas que atendam a segurança social. Há diferentes formas de se fazer isso, desde a atuação na área comunitária ao mecanismo de repreensão que garanta segurança junto com um processo de educação”, opina, dizendo que uma série de fatores contribui para a ocorrência constante de crimes.
Para ela, todo o trabalho de segurança pública deve ser integrado com ações educacionais e até mesmo de planejamento urbano. Além disso, acredita que os bens públicos não são distribuídos adequadamente em bairros periféricos. “Está tudo concentrado na capital, que não possui planejamento urbano, com serviços públicos suficientes para atender a população que migra”, analisa Eline Jonas.
Desigualdade
“Goiânia concentra a maior parte dos homicídios por conta do número de habitantes e também por nada ter sido feito para alterar a desigualdade social.” A constatação é do sociólogo Dijaci David de Oliveira, da Universidade Federal de Goiás (UFG). Para ele, os governantes não promoveram nenhum mecanismo especifico capaz de romper a estrutura de violência. “Os índices não vão diminuir enquanto não existir programas consistentes”, disse. O estudioso critica a atuação dos poderes legislativos – estadual e municipal. Segundo ele, a Assembleia Legislativa e a Câmara Municipal de Vereadores estão mais interessados em ações oportunistas e não produzem debate sistemático sobre o assunto.
Dijaci cita como exemplo a questão dos moradores de rua. “Desde os primeiros casos até agora nada foi feito”, alertou. O primeiro morador foi assassinado em Goiânia em agosto do ano passado. Desde então, assassinatos contra a população em situação de rua acontecem com frequência. Já são 28 mortos na região metropolitana – 27 em Goiânia e 1 em Aparecida de Goiânia.
O sociólogo, assim como a Secretaria de Direitos Humanos do Governo Federal, acredita na existência de um processo de extermínio. “O que está acontecendo agora foge de toda normalidade”, avalia. A situação não é diferente para os jovens que não abandonaram as famílias, mas são carentes de espaços culturais. “Os jovens são as principais vítimas da violência, pois não têm espaço pra frequentar nas horas vagas. Se não têm espaço esportivo e não têm recursos para ir ao cinema, qual a diversão possível para um bairro de baixa renda?”, indaga.
Ele defendeu a necessidade da criação de oficinas culturais, programa de acesso ao cinema ou quadras poliesportivas, e destacou que, mesmo que o jovem não tenha dinheiro, ele consegue ir para o bar, assistir futebol, por exemplo. “Mas é um ambiente que facilita muito a violência, onde tem consumo de álcool.”
Para ele, as políticas públicas ainda não existem por falta de iniciativa. “Quando existe alguma lei, não tem diálogo. As leis são feitas como políticas de gabinete, distante da sociedade. Precisa se aproximar para que seja colocada em prática. Se a população não está consciente, a população não adere”, ressalta Oliveira.
O sociólogo aponta que políticas preventivas não são as preferidas dos políticos. “O resultado pode ser demorado e só vai aparecer, possivelmente, no outro mandato. Essa é a razão de optarem por políticas imediatistas. As ações imediatistas são boas para os políticos e ruins para a sociedade,” opinou.
Modelo de policiamento atual recebe crítica de sociólogos
Para o sociólogo Dijaci David de Oliveira, ações de policiamento proporcionam apenas sensação de segurança. “Quando acontece policiamento no local, a violência migra. Por isso, é preciso de outros mecanismos”, detalha.
Ao deixar o comando geral da PM, coronel Edson Costa, em seu discurso, desabafou com relação à atuação das policias. Ele acredita, como divulgado na época pelo O HOJE, que os sistemas policiais estaduais são divididos e caóticos. “O Brasil tem duas opções: o estabelecimento do ciclo completo para as duas polícias, com divisão das competências pela gravidade penal, ou unificação imediata das polícias estaduais”, disse.
O sociólogo acredita que a unificação do policiamento é uma situação difícil de cotar devido o conflito atual entre as duas instituições. A socióloga Dalva de Souza acredita que a realidade deve ser analisada pensando em cada Estado. “No Estado de Goiás é extremamente difícil, pois há um enfrentamento (de instituições).” A especialista Eline Jonas também defende a união em um plano integral de sociedade que garanta o direito à cidadania.
Fonte: Jornal O Hoje