UEG completa 14 anos em meio ao drama

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57% dos professores e 77% dos técnicos administrativos estão em situação irregular na UEG. Alunos vão às ruas para protestar

A festa dos 14 anos de criação da Universidade Estadual de Goiás (UEG) foi nas ruas. Mas no lugar de comemoração, houve protestos. Centenas de estudantes de todo o estado marcharam pelas principais avenidas do centro de Goiânia na última terça, 16, denunciando as precárias condições da instituição e exigindo melhorias imediatas.

Com máscaras de patos, faixas e apitos, estudantes e professores clamavam por condições básicas de estrutura física e pedagógica. Mas as reivindicações vão além.

Embora a UEG tenha saído do papel no dia 16 de abril de 1999, ela foi fruto da incorporação de diversas faculdades estaduais criadas na década de 1960 e por isso vem acumulando problemas há mais de 50 anos.
A falta de reformas físicas, a ausência de concursos públicos e diversos problemas na gestão deixaram as unidades sucateadas, relegou a universidade à ilegalidade e culminou no afastamento de dois reitores, acusados de improbidade administrativa. “Há descasos acumulados de anos que nos alcançam agora no presente e demandam um esforço quase sobre-humano para atender todas as reivindicações,” explica o atual reitor da UEG, Haroldo Reimer.

Enquanto estudantes e professores protestavam pelas ruas de Goiânia, em Anápolis era realizada uma solenidade em comemoração ao aniversário da instituição com a presença do reitor, que aproveitou o momento para ressaltar os avanços recentes da universidade.

Segundo Reimer, em sua gestão, houve o acréscimo de 610 bolsas para alunos, repasse de R$8 mil para cada unidade adquirir livros para o acervo bibliotecário e autorização para realização de concursos públicos, com a abertura de 500 vagas para técnico-administrativos e 250 para professores.

O reitor também destacou o decreto que autoriza a UEG a licitar e realizar suas obras, mas grande parte das reformas, ampliações e construções ainda está a cargo da Agetop (Agência Goiana de Transportes e Obras Públicas).

As declarações de Reimer, porém, não alcançaram os alunos que estavam nas ruas. Na quarta, 17, um novo protesto paralisou a BR-060, em frente a sede de Anápolis. Os universitários foram recebidos pela reitora em exercício, Valcemia Novaes, que pediu que eles formalizassem um documento com as reivindicações.
Mas enquanto a burocracia emperra o diálogo e as reformas emergenciais, muitos estudantes estão sofrendo graves prejuízos pedagógicos e correndo riscos, pois alguns prédios da universidade não apresentam as mínimas condições de segurança.

Se pegar fogo...

Durante a manifestação, vários estudantes foram ouvidos pela reportagem. Aluna do curso de Química Industrial na unidade universitária de Anápolis, Débora Alves reclamou a falta de equipamentos e de técnicos nos laboratórios da faculdade. “Não temos restaurante nem água tratada. A água que ingerimos não tem cloro e ainda assim eles colocam nos bebedouros para os alunos.”

Flávia Silva, estudante de Arquitetura, reforça. “E nos banheiros não tem papel higiênico nem sabonete.” A falta de lanchonetes e do restaurante universitário é outra queixa de alunos, servidores e professores. Para se alimentarem, eles correm risco todos os dias ao serem obrigados a atravessar a BR-060, que não tem passarela ou faixa de pedestre.

Na Eseffego, em Goiânia, a situação também é precária. As salas não comportam a quantidade de alunos e as quadras e piscinas estão em situação lastimável, o que coloca em risco a segurança de estudantes e professores. “Se fizerem uma inspeção do Corpo de Bombeiros ou da Vigilância Sanitária, eles interditam tudo. A reforma não é para amanhã, é para hoje!”, defende o professor Alcio Crisóstomo.

De acordo com o presidente do DCE, Jefferson Acevedo, algumas unidades universitárias sequer possuem extintores de incêndio, o que causa grande insegurança entre alunos, servidores e professores.

De quem é a culpa, afinal?

O reitor da Universidade Estadual de Goiás (UEG), Haroldo Reimer, assume que as unidades de Anápolis e da Esefego, em Goiânia, necessitam de intervenções estruturais urgentes.

Contudo, ele destaca que, ano passado, R$9 milhões foram destinados à Agência Goiana de Transporte e Obras Públicas para a realização das obras, mas nem todas puderam ser feitas.

Reimer ainda sublinha que a falta de materiais de limpeza e de higiene, além de extintores de incêndio, é de responsabilidade da direção das unidades.

“Toda unidade tem um fundo rotativo trimestral, que pode ser mensal, se necessário, para atender esse tipo de demanda. O bom emprego desta verba depende da gestão local, bem como da participação da comunidade na utilização dos recursos.”

Atenção do governo

Outras reivindicações de estudantes e professores é a aquisição de mais livros para as bibliotecas, criação de um programa de assistência estudantil e maior repasse de recursos para a instituição, que hoje recebe apenas 2% da receita líquida dos cofres estaduais.

Alunos e funcionários acreditam que a atual crise da universidade se deve ao descaso com que os problemas tem sido tratados ao longo dos anos. “Hoje estamos na rua para cobrar mais atenção do governo estadual e maior autonomia para a UEG”, destacou o presidente do DCE (Diretório Central dos Estudantes), Jefferson Acevedo, durante a passeata.

A estudante Débora Alves faz coro a Acevedo. “Estamos aqui para que a sociedade goiana veja os nossos problemas, porque somente enquanto estudantes, nós não conseguimos resolver; precisamos do apoio de todos”, complementou.

Bola dividida

Além da estrutura física e pedagógica caótica, outra situação crítica dentro da universidade é o movimento estudantil.

Atualmente duas chapas disputam a direção do DCE (Diretório Central dos Estudantes). O problema é que as eleições já foram realizadas e um dos grupos chegou a tomar posse, mas ambos continuam atuando em nome dos estudantes.

Tudo porque a eleição foi considerada ilegal pelos estudantes derrotados e até pelo reitor Haroldo Reimer.
O impasse acabou no Ministério Público de Goiás, que convocou uma reunião com os dois grupos para viabilizar um acordo, que não aconteceu.

A proposta do MP era convocar um novo pleito, mas a ideia não foi aceita pelo presidente do DCE que registrou a ata de posse, Edergênio Vieira. “Aceitar essa nova eleição é aceitar que a anterior foi ilegal. E nós temos a convicção de que nosso processo foi fundamentado na carta maior que dirige a instituição, que é o estatuto”, ressalta.

Divergências

Em seu segundo mandato no DCE da UEG, Edergênio lançou a proposta de dividir a gestão com a outra chapa, representada por Jefferson Acevedo, mas a proposta foi recusada porque Acevedo afirma que houve fraude nas eleições e que o grupo de Edergênio tem um histórico de “relações perniciosas” com a antiga reitoria.

“Nós fizemos uma eleição, mas a outra chapa registrou a ata. Esse grupo esteve na gestão do DCE durante 10 anos e ficou atrelado aos dois ex-reitores, que foram afastados. Nós não aceitamos dividir a gestão porque essa chapa está ligada a uma prática de corrupção dentro da universidade”, justifica Acevedo.
Enquanto um acordo não é selado, o movimento estudantil da UEG não é reconhecido pelo atual reitor e, consequentemente, pelo governo estadual.

A aluna de Geografia, Stefane Amâncio, resume bem o impasse: “O maior prejuízo é sempre para os estudantes. É muito ruim para nós, porque o movimento estudantil fica dividido e motiva a desunião.”

Arquitetura sem professor

Atualmente, a UEG tem 57% de seus professores e 77% de seus técnicos administrativos em situação irregular. Todos possuem contratos temporários há mais de 12 meses.

Outro problema são os salários defasados. “Queremos uma reposição, pois estamos com uma defasagem de 25%. Os salários dos temporários são uma vergonha; eles ganham a metade do servidor efetivo. É por isso que são abertos tantos processos seletivos e não tem inscritos, gerando o déficit de funcionários”, alerta o professor de Políticas Educacionais na unidade de Anápolis, Renato Ribeiro Leite.

A falta de educadores é um problema tão sério que afeta 11 disciplinas de Arquitetura e de várias outras do curso de Audiovisual, em Goiânia. “Na quarta e na quinta, os alunos ficam sem aulas por falta de professores”, ressalta Acevedo.

Mas a situação é ainda pior no interior. “Estamos com quatro turmas sem professores e outros 12 alunos estão fazendo a monografia sozinhos porque a universidade não tem orientadores”, denuncia Railson Soares Cardoso, estudante de Pedagogia em Luziânia.

Concurso público

A falta de funcionários também atinge a parte administrativa e técnica da universidade. Segundo Acevedo, há vários laboratórios sendo fechados pela deficiência de pessoal. “Antes tínhamos uma média de oito estudantes para cada técnico, mas hoje temos unidades que têm apenas 1 para atender até 20 estudantes.”
Um novo concurso público, com 250 vagas para docentes e 500 para administrativos, já está previsto, segundo o reitor Haroldo Reimer. Ele promete também reposição salarial para professores e administrativos do quadro efetivo, mas não sabe dizer quando.

Já em relação aos servidores, o reitor considera que a questão é estrutural e não de gestão. Ele admite que a remuneração oferecida não é nem um pouco atrativa. “Muitos professores e técnicos saíram da instituição e não há inscritos para novos contratos por conta dos baixos salários oferecidos pela UEG.”

Fonte: Tribuna do Planalto