Mais veículos não resolvem problema do transporte
Com vias saturadas e sem corredores preferenciais, mais veículos na ruas é sinônimo de mais lentidão no trânsito
Colocar mais ônibus nas ruas, como pedem muitos usuários do transporte coletivo, pode não ser a solução para a melhoria do sistema. A medida pode gerar o contrário do desejado, ou seja, tráfego ainda mais lento nas vias, mesmo as preferenciais. Especialistas em trânsito defendem a priorização do transporte público, com criação de vias prioritárias e preferenciais. Mas, caso os gestores optem pela ampliação da frota, só deve ser realizada após estudo detalhado de demandas.
Coordenador da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP Regional Centro-Oeste), Antenor Pinheiro é categórico ao afirmar que Goiânia não precisa de mais ônibus, mas sim de mais viagens. “Com as vias saturadas e sem corredores exclusivos ou preferenciais, não há como os ônibus fluírem com velocidades ideais. Assim, fica impossível cumprir planilhas de horários enquanto estiverem disputando espaços com carros, caçambas, motocicletas e sistemas semafóricos obsoletos”.
Antenor afirma que o ônibus que há três anos totalizava dez viagens diárias, no mesmo trajeto hoje ele faz quatro viagens. Isso ocorre porque a frota circulante com a qual disputa espaço aumentou. Goiânia já possui hoje quase um carro por cada habitante. Essa realidade colabora para a falsa ideia de que não há ônibus em número suficiente, segundo o especialista. “Colocar mais ônibus nas linhas que não contam com corredores dedicados agrava ainda mais o sistema de mobilidade. Podemos ter a melhor tecnologia de controle de frota, os melhores técnicos na operação do sistema, a melhor regulamentação, os melhores terminais, os mais confortáveis abrigos, ônibus novos e acessíveis, mas, se não tivermos o básico na infraestrutura (corredores) para os ônibus fluírem com prioridade, eles não chegam e comprometem toda a modernidade”.
Arquiteta e urbanista, Erika Cristine Kneib afirma que aumentar o número de ônibus pode ajudar, mas não resolve a questão. “A infraestrutura adequada, com corredores, pontos de parada e terminais, é de suma importância para a qualidade do serviço. Sem infraestrutura adequada, como corredores, os ônibus ficam presos nos congestionamentos, comprometendo a frequência e pontualidade”.
Financiamento
Erika, que é mestre e doutora em transportes, lembra que a população cresce a cada dia e entende que, assim, cresce também a demanda pelo transporte público com maior frequência. “É possível que o ônibus passe de 10 em 10 minutos no ponto? Sim, é possível. O que muitos esquecem é quanto isso vai custar? Quem vai pagar? Isso leva a uma questão importante, que é o financiamento do serviço no Brasil e principalmente na Região Metropolitana de Goiânia”. A arquiteta comenta que em Goiânia todo o custo do serviço é dividido pelo usuário pagante. Lembrando que mais de 20% não pagam ou têm descontos, como idosos, deficientes, estudantes. Esse benefício deve ser custeado pelo Estado e não pelo usuário.
A especialista acrescenta que a gratuidade do transporte para alguns encarece para quem paga e a qualidade acaba diminuindo. “Por exemplo, se o serviço custa R$ 2,80, ele terá qualidade de menos de R$ 2,80, possivelmente de R$ 2,00, que seria a tarifa arrecadada equivalente ao número de pessoas que pagam. Em outros países e cidades, o serviço é altamente subsidiado pelo poder público”. Erika cita que exemplo de Estocolmo, na Suécia, onde, para se deslocar um cidadão de transporte público custa o equivalente a R$ 26. “Todavia, o governo subsidia em 60% da tarifa, o que possibilita ao serviço ter qualidade de R$ 26 e o usuário pagar apenas R$ 10”, exemplifica.
Fonte: Jornal O Hoje
Foto: Danilo Bueno