Morros: O topo de Goiânia dominado

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Três mais altos pontos de Goiânia se transformaram em reduto de evangélicos e, às vezes, de criminosos

Se Pedro Ludovico Teixeira visse hoje no que se transformou os arredores e parte dos principais morros de Goiânia, com certeza se espantaria com os efeitos da expansão acelerada da cidade. Em 80 anos de história, a maior parcela do cerrado nativo e dos descampados virgens daquele terreno vasto que despertou o interesse do fundador da capital foi ocupada por edificações e dividida em loteamentos. Hoje, o pouco que resta de vegetação e espaço livre nos montes de Goiânia é refúgio para cultos e visitas diárias de evangélicos e, por vezes, serve até de cenário para a prática de atividades criminosas.

Cada um em uma região da cidade, o Morro da Serrinha, na parte Sul, o do Mendanha, na parte Oeste e o do Além, na Região Norte são os três exemplos sintomáticos da rapidez da ocupação e da demora para se desenvolver políticas ambientais direcionadas. Em todos eles existem frações de áreas públicas, inclusive áreas de preservação ambiental (APA´s), como é o caso do Morro do Mendanha, que assim é classificado desde a sanção da lei que instituiu o Plano Diretor de Goiânia, em 2007. As áreas públicas dos Morros do Além e da Serrinha, segundo a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano Sustentável (Semdus), estão sob a tutela do Estado.

O Morro da Serrinha é o que possui a maior área, conforme a Prefeitura. Ao todo, são 108,6 mil metros quadrados que resistem em meio ao crescimento da cidade, já que em volta está tomado por casas, prédios e edifícios comerciais. Há muito se fala sobre a implantação de um parque e a estruturação do local, mas, até então, nada se efetivou. Procurada pelo POPULAR, a Secretaria Estadual de Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos (Semarh) respondeu, via assessoria de comunicação, que não houve avanço em relação a isso, nos últimos anos, mas que estava prevista a criação de um grupo de trabalho para realizar os estudos técnicos e viabilizar a proposta.

A reportagem visitou os três morros. O Morro do Além é o que apresenta uma ocupação mais estruturada e nítida. Tanto, que, questionadas, pessoas que moram na região há mais de 20 anos não souberam informar ao certo o ponto exato do morro. Afinal, já estão habituadas à presença das casas e comércios nas ladeiras dos bairros próximos. “De 1985 para cá, que deslanchou a construção de moradias aqui, e tudo foi devidamente documentado”, conta o representante comercial Ademir da Cruz, de 49 anos, que mora na região da Vila Cristina há mais de três décadas. Ele se recorda de quando chegou no local, ainda criança, e que a vegetação ocupava, na época, a maior parte do terreno.

PARTICULAR

Tanto o Morro do Além como o Morro do Mendanha faziam parte de grandes fazendas e propriedades privadas que, com o passar do tempo, foram vendidas ou loteadas pelos proprietários. O diretor de Áreas Verdes e Unidades de Conservação da Agência Municipal de Meio Ambiente (Amma), Antônio Esteves, explica que o fracionamento da terra e a criação dos loteamentos são antigos e ocorreram muito antes da implantação das leis atuais. A formação do Jardim Petrópolis mesmo, que é o bairro que fica no Mendanha, foi autorizada, segundo ele, na década de 1950, enquanto o Plano Diretor que considera a área como de preservação só veio em 2007.

Os 63,7 mil metros quadrados do Morro do Mendanha, que compõem a parte de vegetação, estão divididos em três propriedades, sendo que duas delas são públicas, mas a terceira, que é particular, é significativamente maior que as demais. “Para implantar um parque lá é preciso fazer desapropriação”, aponta Antônio, referindo-se às construções de casas, tendas evangélicas e à instalação de torres de rádio e TV em diversos pontos do morro. No momento, segundo ele, não existe nenhuma sinalização da Prefeitura nesse sentido. Todas essas situações são de antes da sanção do Plano Diretor, em 2007. Após isso, de acordo com ele, ficou mais difícil para as pessoas conseguirem liberação para construir na região.

Reportagem do POPULAR do dia 16 de junho mostrou que o espaço do Morro do Mendanha tem sido alvo de uma espécie de loteamento por parte de movimentos evangélicos que instalam tendas no local para promover cultos e vigílias. Antônio Esteves acredita que isso é um agravante, porque, por mais que não sejam edificações propriamente ditas, na visão dele, ainda gera um impacto ambiental, mesmo que mínimo.

Áreas devem ser delimitadas

O diretor de Fiscalização da Amma, Gustavo Caetano Peixoto, diz que solicitou um levantamento da área do Mendanha para delimitar exatamente o que é área pública e o que é área privada. Segundo ele, diversas operações já foram realizadas no local, inclusive com apreensão de tendas, bancos e carpetes, em razão de tentativas de ocupação indevida por parte dos pastores. Esse tipo de ação, no entanto, fica impedida em caso de imóveis particulares, “porque a tutela destes são dos proprietários e não da Amma”, expõe. No Morro do Além, o problema maior, segundo Gustavo, é o despejo de entulhos e na Serrinha já houve denúncias de volume alto dos cultos, mas nada confirmado, durante a averiguação.

Igrejas querem criar associação

Pastor e frequentador antigo das atividades religiosas nos montes da capital, em especial do Mendanha e Serrinha, José Fagundes Barbosa, 48, diz reconhecer a importância de se preservar o meio ambiente, mas defende que a presença dos evangélicos não gera impacto ambiental nenhum. Consciente da possibilidade de implantação do parque no Morro da Serrinha e da consequente adoção de regras sobre o acesso e uso do local, ele adianta que pretende criar a Associação dos Montes Urbanos do Estado de Goiás. A medida seria para regulamentar e amparar o hábito de orar nos montes não só de Goiânia, mas de todo Estado, o que, segundo ele, é uma cultura que já dura há cerca de três décadas.

Fonte: Jornal O Popular (Galtiery Rodrigues)
Foto: Diomício Gomes