Goiânia: Nascentes estão ameaçadas pelo crescimento da cidade
Aumento da população e a necessidade de novos lugares para habitação geram ocupação de áreas que deveriam ser preservadas.
A gestão dos recursos hídricos está diretamente ligada à gestão do solo. Numa cidade como Goiânia, onde a urbanização e o adensamento dos espaços crescem a cada ano, o desafio é harmonizar a relação entre as necessidades de preservar e se desenvolver. Além do João Leite e do Meia Ponte, dois importantes rios que cortam a cidade e que são responsáveis pelo abastecimento público, a capital possui ainda 147 nascentes espalhadas em sua faixa territorial. E nascentes que vão de rio a pequenos ribeirões, cuja longevidade é refém da forma de ocupação e do cumprimento adequado da legislação ambiental.
Ocupar o espaço e, ao mesmo tempo, preservar são situações naturalmente incompatíveis, uma vez que o sentido original do termo preservar seria não tocar, não interferir. Diante da impossibilidade de tal, já que Goiânia é uma metrópole com potencial de crescimento, o certo seria aliar as intenções de maneira sustentável. Há quem diga, no entanto, que as recentes e polêmicas alterações no Plano Diretor, documento que serve de base para, dentre outras coisas, a fiscalização e controle dos órgãos ambientais, foram um golpe duro e que podem gerar sérias consequências para a sustentabilidade e preservação das riquezas naturais de Goiânia.
O ponto principal refere-se à região norte, considerada berço de mananciais, dada a presença de importantes rios e a elevada quantidade de nascentes, a maioria próxima uma da outra. A autorização para construir empreendimentos industriais e galpões nas margens da Avenida Perimetral Norte foi o que gerou debate e manifestação da sociedade. Fora isso, o aceno positivo do poder público para a implantação de novos prédios e moradias em áreas já adensadas também foi alvo de discussão. Todas medidas consequentes em uma cidade que cresce de maneira acelerada, e onde o desafio é tentar minimizar o impacto ambiental dessa velocidade.
Entre 2000 e 2012, Goiânia ganhou em torno de 180 novos bairros, conforme o Anuário da Prefeitura. A população, no mesmo período, cresceu 22%, passando de 1.093.007 habitantes para 1.333.767. Pelos números, já é possível deduzir o impacto gerado em um curto espaço de tempo. Com mais gente e mais bairros, o território é mais ocupado e as zonas livres de intervenção passam a ser menores. As 147 nascentes de Goiânia estão espalhadas pela cidade, quase que de maneira igual, em todas as regiões. E a ocupação, cada vez mais abrangente, com massa asfáltica, prédios e casas, impõe barreiras para o reabastecimento dos lençóis freáticos.
Mata ciliar é fundamental para preservação
Exemplos recentes, como o do Córrego Cascavel, que nasce dentro do Parque Cascavel, no Jardim Atlântico, são capazes de ilustrar tal situação. No ano passado, o lago do parque precisou ser esvaziado para limpeza e retirada da sujeira levada pela água da chuva. O excesso de resíduo ocasionou o assoreamento do rio, cujas margens são historicamente ocupadas por imóveis e as proximidades foram alvo, nos últimos anos, da especulação imobiliária e acentuada verticalização. O mesmo ocorre, agora, no lago do Parque Carmo Bernardes, no Parque Atheneu. Os técnicos da Agência Municipal de Meio Ambiente (Amma) iniciaram o processo de dragagem para retirar o excesso de areia do local.
Os dois casos foram motivados por causa dos problemas de drenagem urbana e aterramento das cabeceiras dos rios. Fora isso, são pontos localizados em fundos de várzea, o que, por si só, já implica em um obstáculo a mais para o reabastecimento do lençol. À medida que chove, toda a sujeira da rua é levada para dentro do rio e, com a dificuldade de escoamento, os resíduos ficam retidos e geram acúmulo de sujeira. O diretor de Áreas Verdes e Unidades de Conservação da Amma, Antônio Esteves dos Reis, reconhece que é um desafio manter a preservação dessas áreas.
A Agência é responsável, hoje, por 219 áreas públicas verdes. Dessas, 20 possuem nascentes, mas quase todas são cortadas por algum curso hídrico. Algumas, inclusive, já são parques estabilizados, como o Vaca Brava, Areião, Jardim Botânico e o próprio Jardim Zoológico, onde nascem os rios Vaca Brava, Areião, Botafogo e Capim Puba, respectivamente. Juntas, elas compõem uma área total de 17 milhões de metros quadrados. No entanto, essas áreas estão fragmentadas pela cidade e, conforme o município vai crescendo, elas vão ficando isoladas no meio dos bairros e é praticamente inevitável a pressão que passa a existir sobre elas.
Antônio diz que a saída é seguir a legislação e fiscalizar se a ocupação é feita, segundo o que é estabelecido na legislação no que se refere às áreas de proteção permanente (APP). Fora isso, ele pontua que, no caso dos parques com nascentes, a solução encontrada, em primeiro momento, para garantir a qualidade e quantidade da água é a reconstituição da mata ciliar. Ele frisa, no entanto, que isso, apenas, não assegura. É preciso fazer um serviço paralelo de edificação das cabeceiras e fiscalização quanto ao respeito da faixa de ocupação (50 e 100 metros, dependendo do rio). O projeto do Parque Macambira Anicuns é uma ação que visa, dentre outras coisas, a preservação das nascentes de tais rios, mas a obra está paralisada.
Fonte: Jornal O Hoje