Goias: Migração hora de mapear os estrangeiros
Goiás é peça chave para programa federal que quer estudar presença de imigrantes.
Há em Goiás uma multidão anônima. São pessoas que deixaram seus países fugindo de condições adversas e aportaram no Estado buscando uma vida melhor. Nenhum órgão sabe ao certo quantos são e onde estão esses imigrantes. São histórias como a do dominicano Rigoberto Francisco ou dos bengalis que haviam se instalados em Pires do Rio. Esse cenário será descortinado na 1ª Conferência Nacional Sobre Migrações e Refúgio (Comigrar), marcada para maio, em São Paulo. A iniciativa, entretanto, levanta questionamentos sobre as contrapartidas para beneficiar os 6 milhões de brasileiros que vivem no exterior, 300 mil deles goianos.
No dia 13 deste mês, Ofélia Ferreira da Silva e Jana Petaccia de Macedo, respectivamente consultora do Ministério da Justiça e coordenadora do Departamento de Estrangeiros da pasta, integrantes do comitê organizador da Comigrar, estiveram em Goiânia para debater o assunto. Para o Ministério das Relações Exteriores, Goiás possui a melhor prática de relações internacionais do País, por isso a importância da representação goiana. Idealizado por Elie Chidiac, titular da Secretaria de Assuntos Internacionais, e hoje parte integrante da Secretaria de Estado de Políticas para Mulheres e Promoção da Igualdade Racial (Semira), o Comitê Executivo de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas (CCETP) tenta mapear a presença de imigrantes em Goiás.
Em condição legal ou não no Brasil, os estrangeiros também terão representação na Comigrar. “Junto com a Procuradoria do Ministério do Trabalho e da Polícia Federal queremos saber onde estão essas pessoas, o que fazem e as condições de trabalho a que estão submetidas. Nosso objetivo é mobilizá-los para que apresentem suas propostas”, explica o coordenador do CCETP, o advogado Valdir Monteiro da Silva.
Titular da Semira, Glaúcia Teodoro dos Reis diz que recebe rotineiramente informações sobre a presença de imigrantes, alguns trabalhando em condições análogas à escravidão.
Para fugir de guerra civil na Síria, quatro famílias vêm para Anápolis
Cônsul honorário da Síria em Goiás, o médico Jamal Yusuf sente no Estado o reflexo da guerra civil em seu país que levou à morte, até o momento, 130 mil pessoas. Cerca de quatro famílias chegaram a Anápolis em 2013 buscando uma vida melhor. Na cidade vivem cerca de 10 mil descendentes sírios e as famílias que vieram, segundo o cônsul, têm relações de parentesco na localidade. Embora tenham entrado com vistos de turistas, pediram refúgio junto à Polícia Federal e estão trabalhando. “A maioria veio de região que não tem conflito, mas a situação na Síria está complicada e o futuro é incerto”. A guerra civil que começou em 2011 destruiu a infraestrutura do país e gerou uma crise humanitária. Mais de 2 milhões de sírios estão refugiados em nações vizinhas.
Jamal Yusuf procurou as famílias e verificou que todas estão amparadas. É uma situação diferente da vivida por 11 pessoas, de um mesmo grupo familiar, localizadas pela Polícia Federal no aeroporto de Fortaleza com passaportes e bilhetes aéreos falsos. Fugindo da guerra na Síria, eles foram para a Turquia, de lá para o Rio de Janeiro, em seguida para Fortaleza de onde pretendiam embarcar para Portugal. Com a ajuda de um intérprete, o líder do grupo explicou que eles saíram da Síria somente com a bagagem de mão.
Após quatro anos, terremoto no Haiti ainda traz imigrantes
O terremoto que arrasou o Haiti em 2010 continua expulsando milhares de pessoas. Inicialmente, levas de homens deixaram o país rumo ao Brasil em busca de trabalho. Em seguida, entraram em cena os coiotes, agentes de fronteira que fazem falsas promessas em troca de dinheiro e introduzem os imigrantes de forma ilegal no País. Mais de 20 dos primeiros que chegaram conseguiram emprego numa indústria de bioenergia em Caçu, no Sudoeste goiano. Outros se espalharam por vários municípios do Estado, como Pires do Rio.
A Polícia Federal em Goiás sentiu a movimentação. De acordo com o delegado Umberto Ramos Rodrigues, nos últimos meses de 2013 e nos primeiros dias de 2014 muitos haitianos solicitaram atendimento no serviço de imigração. “Eles ingressaram no Brasil pelo Acre, onde solicitaram refúgio, mas compareceram no nosso núcleo para consulta do processo e prorrogação da validade do protocolo”.
Foi do Acre que saíram 13 haitianos que chegaram a Trindade em novembro, com promessa de emprego numa cerâmica. Em Porto Velho (RO), para onde tinham seguido por intermédio da Pastoral do Imigrante, conseguiram colocação em uma empresa goiana, mas não concordaram com o salário inicial alegando que precisavam de mais dinheiro para enviar aos familiares no Haiti.
Dominicano diz que se sente em casa
A Comigrar será importante para definir ações estratégicas de apoio ao público imigrante. Em Goiás, o dominicano Rigoberto Francisco, 24 anos, se sente em casa. Ele trabalha na Olderich, em Orizona, mora sozinho numa casa alugada e todo mês envia dinheiro para a mãe e a irmã que ficaram na República Dominicana. Formado em Turismo, ele viajou de avião até o Equador e de lá pegou ônibus para o Peru até entrar no Brasil. Contratado como auxiliar de produção, ele passou pela manutenção e hoje é estoquista. “Gosto muito do meu trabalho. Pretendo morar aqui o resto da vida”, diz Rigoberto que, “mais ou menos” já arrumou uma namorada.
A situação, entretanto, é muito diferente para Mohamed Shaheed, 60 anos, natural da ilha caribenha de Trinidad Tobago. Desde agosto do ano passado ele está internado no Centro de Readaptação e Reabilitação Dr. Henrique Santillo (Crer), em Goiânia. Mohamed estava hospedado sozinho num hotel da capital onde sofreu um Acidente Vascular Cerebral (AVC). De lá foi levado para o Cais da Vila Nova e em seguida para a UTI do Crer. A unidade acionou a Secretaria de Relações Internacionais na tentativa de localizar algum parente. “Nenhum familiar se interessou por ele”, disse o titular da pasta Elie Chidiac.
Proposta de emprego gera migração
Em maio e agosto do ano passado O POPULAR publicou reportagens mostrando a movimentação de bengalis - grupo étnico de uma região situada na Índia e Bangladesh - em Goiás. A grave crise política desencadeada no início de 2013 em Dacca, capital do Bangladesh, seu país de origem, levou ao êxodo milhares de jovens. Centenas deles buscaram o Brasil acessando o País via Acre ou Mato Grosso do Sul. Nesses Estados foram enganados por quadrilhas que ofereceram falsos empregos em Brasília. Desde então passaram a viver em condições subumanas na periferia da capital federal até serem localizados pela Polícia Federal. A partir daí receberam ofertas de num frigorífico de frangos em Pires do Rio, em Goiás.
Mais de 30 bengalis que pediram refúgio na Superintendência da Polícia Federal em Goiás foram absorvidos como auxiliar de produção na Nutriza, o grupo do qual faz parte o frigorífico Friato, de Pires do Rio. Por realizar o abate halal, que respeita os princípios do Islamismo, a fé que professam, o emprego parecia convidativo. Quando O POPULAR os visitou, em agosto, os jovens bengalis aparentavam cansaço e saudosos de casa, mas felizes por estarem empregados. Durou pouco. Eles já buscaram novos rumos. Segundo a empresa, nenhum deles permaneceu em Pires do Rio. Como receberam proposta melhor no sul do País decidiram ir embora. A princípio, eles teriam buscado Santa Catarina onde trabalha um grande número de compatriotas.
Delegado Regional Executivo da Polícia Federal, Umberto Ramos Rodrigues lembra que os imigrantes formam comunidades no sentido de auxílio e proteção. “Embora as ações governamentais tenham que ter caráter humanitário, as medidas de controle migratório são fundamentais e esse é o grande desafio”, afirma. O delegado ressalta “que o fluxo migratório é normal em qualquer país, o problema é alguém ganhar dinheiro com isso”.
Fonte: Jornal O Popular
1 comentários:
Write comentáriosSem dúvida de que se trata de uma questão humanitária! No entanto, os brasileiros já não poderão mais criticar as medidas de contenção do fluxo migratório a exemplo dos EUA e da UE em razão do nosso país estar vivenciando uma realidade que é consequência do desenvolvimento econômico e da propaganda feita no exterior de que o Brasil é um país pacífico e hospitaleiro.
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