Frota cresce de forma insustentável. Transporte coletivo fica em 2º plano
Em duas décadas, a frota de veículos em circulação em Goiânia cresceu quase cinco vezes. Em 1990, pouco mais de 200 mil veículos nas ruas e avenidas ainda cheias de espaço. Vinte anos depois, a frota de automóveis, motocicletas, caminhões e ônibus caminha para 1 milhão de unidades. O avanço é superior ao registrado no restante do País no período.
Falta espaço para tanto carros nas ruas, especialmente para a operação do transporte público, o mais penalizado nesse contexto. Uma política de mobilidade voltada exclusivamente para o transporte individual, analisam especialistas ouvidos pelo POPULAR, criou um cenário que caminha para o caos próximo. "Goiânia nunca teve uma política de transporte público", sintetiza o arquiteto e urbanista Renato Rocha, diretor do curso de Arquitetura da Escola do Ambiente. "O que vemos todos os dias é a redução de calçadas para aumentar a largura de pistas de rolamento", exemplifica. Renato cita ainda a duplicação de avenidas, a abertura de outras e a construção de viadutos como exemplos de uma infraestrutura pensada exclusivamente para o automóvel. "De outro lado, não há qualquer investimento na melhoria das calçadas. Não há em Goiânia uma quadra completamente acessível. Uma cidade que oferece todas as condições favoráveis não dispõe de uma única ciclovia", critica.
O urbanista cita alguns exemplos que seguem na direção oposta. "Em Bogotá está o melhor sistema de transporte do mundo. Além de um transporte coletivo urbano eficiente, os outros modos de transporte contribuem para que as pessoas usufruam mais do espaço urbano", afirma. "Lá, o custo de uma corrida de táxi é um terço menor que em Goiânia, em média. Isso é possível porque há investimentos do governo. Isso é política de transporte", comenta Renato rocha.
A escolha pelo transporte individual, salienta o arquiteto, segue na contramão do cenário atual existente nas cidades brasileiras. Dados da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP),lembra Renato Rocha, mostram que a principal forma de deslocamento do brasileiro é a pé. Em segundo vem os deslocamentos de bicicleta, depois de ônibus e somente em quarto o deslocamento feito por automóvel. No entanto, faltam investimentos em calçadas acessíveis, em ciclovias e em sistemas de transporte público eficientes, baratos e menos poluentes. "A continuar assim, vamos nos acostumar a ver a cidade apenas pela janela do carro", observa.
Bairros nobres atraem carros
O crescimento desordenado de Goiânia levou à necessidade cada vez maior de deslocamento. Essa característica, cita o professor da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO), arquiteto e urbanista Dirceu Trindade, é um dos fatores que se somam às problemáticas ligadas ao aumento da frota de veículos. "Há que se estabelecer um processo de planejamento que pense o aumento de concentração urbana em áreas devidamente equipadas para reduzir os deslocamentos", ressalta. "A alteração na mobilidade da população trocando o automóvel por transporte coletivo é um caminho certo que devemos desenvolver, entretanto, precisa-se reconhecer que um único modal, o metrô, por exemplo, não será capaz de resolver a questão tendo em vista as dimensões atingidas pela ocupação urbana", sustenta.
O professor Dirceu Trindade cita o exemplo do Setor Bueno. "Na década de 1990, o índice de aproveitamento dos terrenos no Setor Bueno (metros quadrados de construção permitidos), que é um parâmetro que determina a densidade local, passou a ser de 3,5 metros. O resultado foi a transformação de um bairro de casas isoladas, unifamiliares, em um bairro densamente verticalizado, e sem o aumento adequado de equipamentos, transporte e alternativas de circulação viárias necessárias a esta população", explica.
Automóvel
Em síntese, afirma o arquiteto e urbanista Dirceu Trindade, a opção pelo automóvel particular não foi acompanhada de um processo de planejamento urbano. "O que ocorre é que o enorme aumento de população em determinadas áreas da cidade, sobretudo as áreas nobres ocupadas pela classe média, não recebeu adequados investimentos urbanos. Desta forma, a demanda por moradia, equipamentos de educação, saúde e segurança, serviços e lazer urbanos obrigam a uma mobilidade intensa, por vias que não suportam este incremento de circulação", afirma.
"É certo que a cidade, suas ruas e avenidas não estão preparadas para o crescimento da frota de veículos registrada nos últimos anos em Goiânia", diz o professor.
Fonte: O Popular