Avenida Goiás é a mais completa de Goiânia
Especialistas apontam a via mais emblemática da capital como a mais adequada para a segurança viária. Por outro lado, Avenida Anhanguera é vista como a mais incompleta
A Avenida Goiás, no Centro, é considerada por seis de nove especialistas ouvidos pelo POPULAR, como a rua mais completa de Goiânia. Apesar de muitos problemas a serem resolvidos, a via ganhou o posto de melhor entre as principais avenidas da capital em razão de sua arborização, as calçadas largas, o corredor exclusivo para o transporte coletivo e o canteiro central, com a vegetação e equipamentos urbanos que facilitam a convivência entre as pessoas. Por outro lado, sete votos foram dados à Avenida Anhanguera como a que mais está distante do conceito de Rua Completa.
Este conceito foi difundido desde que a cidade de Boston, nos Estados Unidos, em 2013, em que o departamento de trânsito criou um programa de criação e implantação de projetos que criem as ruas completas. Atualmente, sete bairros ou regiões da cidade estão se adequando. Trata-se de uma rua em que todas as pessoas possam se locomover com segurança, independente do meio de transporte escolhido, além de valorizar o meio ambiente e a acessibilidade. A iniciativa começa a ter programas privados de incentivo para a sua criação no Brasil.
Embora ainda não se tenha chegado a Goiânia, o POPULAR pediu a nove especialistas da capital para que eles identificassem, dentre as principais avenidas da cidade, qual está mais próxima de ser uma rua completa e qual está mais distante deste conceito, pensando apenas em critérios técnicos. O arquiteto e urbanista Leo Romano ressaltou que Goiânia “não tem nenhuma rua com situação 100% satisfatória, tecnicamente falando”, mas por ter sombreamento e possibilidade de trânsito para pessoas, em razão do canteiro central, fez com que sua escolha fosse a Avenida Goiás.
Já a escolha do geógrafo e professor da Universidade Federal de Goiás (UFG), Tadeu Arrais, foi em razão dos “bancos de madeira e o sombreamento das árvores e dos prédios, em horários distintos”, pois estes “tornam o simples ato de sentar nos bancos algo muito agradável”. “Arrisco-me a dizer que não há avenidas com tantos bancos para o público na cidade. A manutenção tem deixado a desejar, o que prejudica a limpeza e a iluminação. Mas a Goiás, no contexto geral, é um charme só”, diz. O arquiteto e urbanista Bráulio Ferreira, também professor da UFG, evidenciou as calçadas largas, a arborização e a acessibilidade.
“A arborização garante uma circulação mais confortável para os pedestres e ciclistas. As calçadas são largas e os equipamentos urbanos como os bancos, localizados nas ilhas centrais, também oferecem mais uma facilidade aos usuários. Embora não tenha ciclovia ou ciclofaixa, a baixa velocidade máxima garante mais segurança aos ciclistas. O corredor de ônibus, por sua vez, propicia mais qualidade à mobilidade das pessoas que utilizam o transporte coletivo”, diz a arquiteta e urbanista e conselheira do Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Goiás (CAUGO), Adriana Mikulaschek.
O professor de Engenharia de Trânsito do Instituto Federal de Goiás (IFG), Marcos Rothen, reforçou que a Avenida Goiás “tem espaço para caminhar, as calçadas e o canteiro central permitem que caminhemos sem termos que desviar de obstáculos naturais e artificiais, principalmente os vendedores e lojas que tomam contam das ruas, e podemos ainda ter sombras”. Já Erika Kneib, arquiteta e urbanista e professora da UFG, lembrou que se trata de uma via de grande importância, com uma multiplicidade de usos, formas e com muita vitalidade.
“Em geral podemos dizer que ela tem uma forma urbana e uma paisagem urbana já interessantes e com muito potencial. Possui um canteiro largo, arborizado e que convida as pessoas a permanecerem e conviverem.” No entanto, ela ressalta que a avenida deve ser aprimorada “para contemplar o conceito de ruas completas e melhorar ainda mais sua condição de espaço para pessoas”. Entre os pontos de melhora, Erika salienta a aplicação de medidas de moderação de tráfego, fiscalização quanto a ocupação das calçadas e estacionamentos irregulares.
Também deveria ter projetos de “melhoria da geometria viária e do mobiliário relacionado ao transporte coletivo, e pensar no espaço para o ciclista”. Arrais completa sobre a necessidade de melhorar a iluminação pública, enquanto Ferreira lembra que se deve reforçar a sinalização. Já a segurança no período noturno e a condição do asfalto são as melhorias apontadas por Adriana Mikulaschek.
Anhanguera perde no quesito pedestre
Calçadas estreitas, falta de arborização e a impossibilidade de atender a todos que a utilizam, sobretudo os pedestres, são os motivos apontados por sete dos nove especialistas ouvidos pelo POPULAR para apontar a Avenida Anhanguera como a mais incompleta da cidade. A arquiteta e urbanista da Secretaria Municipal de Planejamento e Habitação (Seplanh), Leandra de Brito Rodrigues, indica que até mesmo a aparência da via e o trânsito no local são ruins. O arquiteto e urbanista Paulo Renato Alves diz que o tráfego intenso dos veículos particulares e dos ônibus prejudica em muito os pedestres.
Para o professor Tadeu Arrais, o problema da Anhanguera é que ela não possui “nenhum estímulo sensorial, nenhum momento de contemplação que permita uma pausa” ao se trafegar por ela. Neste mesmo sentido, o engenheiro Marcos Rothen alega que há trechos impossíveis para caminhar, com as calçadas ocupadas indevidamente. “A má conservação das pistas dá uma sensação muito ruim tanto para os pedestres quanto para os motoristas”, pontua. O arquiteto Leo Romano diz que a via não tem nada do que se espera de uma avenida.
“Trânsito intenso, sem vegetação, corredores metálicos e grades do ponto de vista estético é prejudicial, ruim, não tem equipamento urbano de apoio para o pedestre e não flui. As mudanças que foram feitas nela só contribuíram negativamente”, afirma Romano. Já a conselheira do CAUGO, Adriana Mikulaschek ressalta ainda que o “asfaltamento é péssimo, falta arborização, a comunicação visual é desordenada, a calçada é estreita, é difícil para os pedestres atravessarem a via. Há trechos da avenida sem uso há muitos anos, o que a tornam muito insegura para os transeuntes”.
A arquiteta e urbanista Erika Kneib ressalta que, apesar de ter um corredor exclusivo, a operação do transporte coletivo “é prejudicada pelo número elevado de interseções e semáforos, além de ter um espaço aquém do necessário em alguns trechos; o usuário de transporte coletivo é prejudicado ao ter seu acesso dificultado às plataformas e plataformas que não atendem às necessidades”. Para ela, os veículos se locomovem em velocidades incompatíveis, gerando insegurança ao pedestre e ao usuário de ônibus.
Universitária e Paranhos citadas positivamente
A Avenida Universitária e a Alameda Ricardo Paranhos foram as outras vias mais citadas pelos especialistas ouvidos pelo POPULAR como mais próximas ao conceito de Rua Completa. A reportagem pediu que os urbanistas citassem outras opções dentre aquela escolhida como melhor. Além disso, o vereador e presidente da Câmara Municipal, Andrey Azeredo (MDB), ex-secretário municipal de Trânsito Transporte e Mobilidade, citou a Rua 10, conhecida como Avenida Universitária, como a mais completa em sua opinião.
A justificativa foi a presença do corredor preferencial de ônibus, a fiscalização eletrônica, a ciclovia “com extrema segurança para o modal bicicleta” e ainda a presença de calçadas padronizadas, além de manter “ao longo de grande parte do seu trecho uma boa arborização”. O presidente da Câmara reforça ainda que o pavimento na via “está em bom estado, o que gera mais conforto e segurança na trafegabilidade”. “Há também boa iluminação à noite, o que facilita o tráfego no local (e aqui não estou considerando a questão da segurança pública, mas a segurança de trafegabilidade da via). Nela também destaco o piso tátil, que gerou acessibilidade ao deficiente visual”, afirma.
Azeredo, no entanto, indica que a Rua 10 ainda necessitaria de maior segurança viária, que poderia ocorrer com a redução da velocidade máxima permitida na avenida, que hoje é de 60 quilômetros por hora. “A redução da velocidade gera melhor fluidez e maior segurança viária para todos os atores do trânsito.” Além disso, ele indica como melhoria a implantação de semáforos sonoros para pessoas com deficiência visual.
Já o arquiteto e urbanista Paulo Renato Alves, avalia que a mais completa via da capital é a Alameda Ricardo Paranhos por ser uma rua “repleta de pedestres e lazer com bares e restaurantes, além de muito utilizada para encontros informais e prática de esportes”. Outro voto dissonante foi da arquiteta da Seplanh, Leandra Rodrigues, que indicou a Avenida Edmundo Pinheiro de Abreu, em razão da presença de ciclofaixa de lazer, calçadas amplas, sinalização eficiente, acessibilidade e arborização, e ainda ter vagas de estacionamento para veículos particulares e acesso para usuários de ônibus.
Dentre as escolhas das vias mais incompletas, os votos diferentes da maioria foram para a Rua 44, também dado por Andrey Azeredo, e para a Avenida 24 de Outubro, na opinião do arquiteto Bráulio Ferreira, professor da Universidade Federal de Goiás (UFG). Para o vereador, a 44 seria a pior da capital especialmente pela falta da fiscalização, insegurança para o pedestre, sinalização precária, falta de acesso para ciclistas e mau atendimento para usuários de ônibus, além de problemas com a arborização e canteiro central degradado.
“Temos que considerar também que existe desrespeito dos ambulantes, que rotineiramente ocupam a via para expor e comercializar produtos de forma irregular, promovendo uso indevido da pista de rolamento. Isso gera, a meu ver, o conceito de uma das piores ruas da cidade de Goiânia hoje”, explica o vereador. Já Bráulio Ferreira indica que não há arborização na 24 de Outubro, o que aumenta a temperatura do espaço urbano, e ainda não se tem calçadas livres e espaço para ciclistas.
SMT aponta T-63 como melhor e Bernardo Sayão como incompleta
Diferente dos votos da maior parte dos especialistas ouvidos pelo POPULAR, a Secretaria Municipal de Trânsito, Transporte e Mobilidade (SMT), apontou a Avenida T-63 como a mais completa de Goiânia. A mais incompleta na opinião dos técnicos e do secretário Fernando Santana é a Avenida Bernardo Sayão. As escolhas da SMT não foram computadas na votação com os especialistas em razão do horário em que as respostas foram dadas à reportagem, apenas no início da noite de sexta-feira, enquanto os demais atenderam o pedido até o início da tarde do mesmo dia. A SMT informou que a opção de Santana foi de ouvir os técnicos da secretaria para discutir sobre as respostas.
Para a secretaria, a escolha da T-63 se justifica por ser uma via larga, com sinalização adequada, ciclovia e calçadas acessíveis. Além disso, a avenida possui arborização considerada suficiente, faixa preferencial para o transporte coletivo que também atende táxis e transporte escolar. O problema na rua, por outro lado, seria a falta de espaço para o estacionamento de veículos particulares. Outras vias apontadas pela SMT entre as mais completas são a Avenida Goiás, que foi a escolhida pelos especialistas, e a Avenida Universitária.
Já em relação à rua mais incompleta em critérios técnicos, a SMT apontou a Avenida Bernardo Sayão por esta ter calçadas estreitas e desniveladas. Os técnicos reforçaram ainda que a via é estreita, mesmo sendo de mão dupla, e ainda apresenta “grande número de mercadorias nas calçadas e placas de publicidade que prejudicam a mobilidade em geral. Como ponto positivo, a Bernardo Sayão tem a geração de emprego e renda, por ser uma via com comércio intenso, e o fato de ser acesso às avenidas Leste-Oeste e Goiás. A SMT aponta também a Avenida 24 de Outubro e a Avenida Marechal Rondon como outras incompletas.
Este conceito de Rua Completa, de acordo com a arquiteta e urbanista Erika Kneib, é “muito importante, que vem ganhando destaque e sem dúvida pode contribuir para cidades melhores”. “As ruas completas contemplam uma mudança de paradigma: a rua antes como um mero espaço de circulação (para carros), passa a ser um espaço público, social, de convívio e de circulação pensado para pessoas. Por isso é tão importante pensar e qualificar o espaço para o transporte coletivo, para o pedestre e para o ciclista. O carro é permitido, mas não é mais o protagonista. Ruas com mais pessoas tornam-se mais seguras. Ruas com mais carros tornam-se inseguras e podem levar à degradação do espaço”, assegura a professora da UFG.
Fonte: Jornal O Popular